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Não cabem honorários advocatícios no incidente de desconsideração da personalidade jurídica

A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que não é cabível a condenação em honorários advocatícios de sucumbências nas decisões interlocutórias que resolvam incidente de desconsideração da personalidade jurídica (RESP 1845536).

Essa decisão é interessante até mesmo para o processo do trabalho, pois a partir da lei 13467/17 (reforma trabalhista) os honorários advocatícios de sucumbência se tornaram regram no processo do trabalho, sendo que o CPC tem aplicação supletiva e subsidiária ao processo do trabalho (art. 15, CPC).

O artigo da CLT que trata precipuamente dos honorários é o artigo 791-A da CLT, pelo qual os honorários são devidos sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, não fazendo referência expressa ao cabimento em decisões interlocutórias.

No caso específico da decisão do STJ, o entendimento foi justamente no sentido de que, por não ser sentença, mas apenas decisão interlocutória, não caberia nessas decisões a fixação de honorários, por força do artigo 85, parágrafo 1º, do CPC.

Vale lembrar, contudo, que o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, no processo do trabalho, tem uma natureza mista, pois da decisão que o resolve é passível recurso imediato ao duplo grau de jurisdição, quando proferida na fase executória do processo. Há ainda a discussão sobre o seu processamento em autos apartados ou na própria execução, sendo que a Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho, em fevereiro de 2019, editou Provimento prevendo o seu processamento nos próprios autos da ação trabalhista original (Provimento CGJT 1/2019, posteriormente absorvido pelo Provimento Consolidado da Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho).

Empregadores e Trabalhadores, fiquem atentos!  

Justiça do Trabalho define método de testagem de profissionais de ensino da rede privada do DF

O MM. Juiz do Trabalho Antonio Umberto de Souza Junior, Juiz Titular da 6ª Vara do Trabalho de Brasília/DF, proferiu sentença nos autos da ACP 601-86.2020.5.10.0006, relativa ao retorno às aulas na rede privada de ensino do Distrito Federal.

No dia  24/08/2020 foi celebrada uma conciliação entre o MPT, o SINPROEP (Sindicato Profissional dos Professores) e o SINEPE (Sindicato Patronal das Escolas), estabelecendo um calendário de retorno às aulas da rede privada do Distrito Federal, mais especificamente do ensino infantil até o ensino médio (educação básica). A conciliação tratou do calendário de retorno, mas também dos protocolos sanitários. Contudo, como havia um impasse relativo ao método de testagem a ser aplicado aos profissionais das escolas, as partes acordaram que isso seria resolvido em perícia judicial, em decisão irrecorrível. Portanto, as partes celebraram um negócio processo quanto a esse ponto específico do protocolo de retorno às aulas. A sentença do MM. Juiz Antonio Umberto tratou exatamente desse ponto: método de testagem.

O Magistrado explicou em sua decisão que a definição oriunda do negócio processual seria o método de testagem e não apenas o tipo de testagem (RT-PCR ou sorologia).

A decisão evidencia que já havia sido ajustado entre as partes que na hipótese de trabalhadores infectados ou sintomáticos para Covid 19, o empregador deveria afastar imediatamente os trabalhadores, para sua recuperação ou confirmação de diagnóstico negativo. Também evidencia que em relação aos trabalhadores do grupo de risco, por força de decreto distrital, já estava previsto que o trabalho seria apenas remoto.

Apontou a decisão, que segundo o Perito judicial, o único teste útil e eficaz para detecção ou confirmação diagnóstica é o RT-PCR, razão pela qual as escolas deveriam realizar esse teste, custeando-o, até 31/12/2020.  Aponta a decisão que o Perito esclareceu que esse teste é extremamente sensível (75%) e específico (99,5%).

No entanto, no que se refere à realização dos exames em trabalhadores assintomáticos, “informou o perito do juízo que não há na literatura científica respaldo para testagem em massa de indivíduos assintomáticos para averiguação da contaminação pelo SARS-CoV-2, seja pelo percentual mínimo de pessoas contaminadas (em torno de 1%), seja pelo incômodo físico trazido pela coleta da secreção naso-orofaringe, seja pelo impacto psicológico de falsos positivos (gerados por contaminação da amostra por alguma falha na manipulação do material pelo laboratório) e de falsos negativos (pela defasagem entre o momento do contágio e disseminabilidade do vírus e o instante de detectabilidade laboratorial do vírus)”. Registrou ainda que segundo o perito “todo teste deve ser dirigido a um indivíduo que tenha uma chance pré-teste razoável” (declaração aos 30’-31’ da audiência de perícia simplificada) e que “o teste é sempre o RT-PCR, mas a triagem de indivíduos assintomáticos que não tenham quadro clínico ou exposição documentada não tem validação na literatura”. A testagem em massa como estratégia isolada traduz-se, segundo relatou, em uso fútil do exame, sem falar na sua condição desagradável e psicologicamente desgastante e no já comentado risco de falsos resultados”, e que por isso, “a melhor estratégia é a testagem dirigida” àqueles com sintomas compatíveis com a Covid".

A decisão determinou que que os profissionais devem ser submetidos a um levantamento do perfil clínico-epidemiólogico individual de cada trabalhador, seja por auto declaração, seja por observação, de forma que aqueles que apresentarem sintomas sugestivos de contaminação, que estiveram em contato por no mínimo 15 minutos e a menos de 2 metros com pessoa infectada ou, por fim, que frequentaram aglomeração sem proteção e distanciamento recomendáveis, nos últimos 14 dias, sejam todos afastados do trabalho e submetidos ao exame RT-PCR.

A decisão determina ainda que os trabalhadores passem por exame feito por médico antes do retorno às aulas, sendo o exame também custeado pelo empregador ou cujo valor seja por ele ressarcido.

A decisão trata ainda de outras obrigações de empregados e empregadores, relacionadas ao método de testagem.

Vale a leitura! Veja a íntegra da decisão.

 

 

 

6ª Vara do Trabalho de Brasília - DF

ACPCiv 0000601-86.2020.5.10.0006

AUTOR: Ministério Público do Trabalho

RÉU: DISTRITO FEDERAL

ASSISTENTE: SINDICATO DOS PROFESSORES EM ESTABELECIMENTOS PARTICULARES DE ENSINO DO DISTRITO FEDERAL – SINPROEP-DF

AMICUS CURIAE:   SINDICATO DOS ESTABELECIMENTOS PARTICULARES DE ENSINO NO DISTRITO FEDERAL – SINEPE-DF

 

S E N T E N Ç A

Ação Civil Pública

Julgamento decorrente de negócio processual

I - RELATÓRIO

Cuidam os autos de exame de pedido concernente à definição do melhor método de testagem dos trabalhadores escolares da rede particular de ensino dentro das medidas preparatórias para seu retorno às atividades presenciais.

Após duas sessões de mediação nos dias 20 e 24 de agosto último, presididas pelo Desembargador PEDRO LUÍS VICENTÍN FOLTRAN, Relator do Mandado de Segurança nº 0000577-76.2020.5.10.0000, com a participação do prolator da presente decisão na segunda sessão, as partes e interessados chegaram a um acordo parcial celebrado nos seguintes termos (fls. 608/610):

“O Juiz Antonio Umberto propõe seja firmado acordo nas questões até aqui negociadas e incontroversas. Com relação à testagem, esclarece que nos autos da Ação Civil Pública em tramitação na 6ª Vara do Trabalho poderá designar perícia para elaboração de laudo relativo ao método de testagem mais adequado para o retorno dos profissionais, caso as partes assim acordem.

Aquiescem as partes com a proposta apresentada pelo Juiz Antonio Umberto.

Assim as partes, incluindo o SINEPE/DF e SINPROEP/DF, firmam acordo nos seguintes termos:

1) Calendário de retorno das atividades presenciais.

  • Retorno da Educação Infantil e do Ensino Fundamental 1 no dia21/9/2020, com apresentação dos professores nas escolas para treinamento nos dias 17 e 18/9/2020.
  • Retorno do Ensino Fundamental 2, dia 19/10, e do Ensino Médio,Profissionalizante e educação de jovens e adultos, dia 26/10/2020, com apresentação dos professores nas escolas para treinamento nos dias 14, 15 e 16/10/2020 e nos dias 22 e 23/10/2020, respectivamente.

O calendário da Educação Infantil se aplica também às creches particulares não conveniadas, devendo ser comunicado o Juízo da MM. 7ª Vara do

Trabalho de Brasília, onde tramita a Ação Civil Pública n.º 0000254-50.2020.5.10.0007, proposta pelo SINPROEP/DF.

Caso haja convocação dos professores para semana pedagógica ou outras atividades preparatórias, antes dos treinamentos presenciais, aludidos nesta cláusula, tais atividades serão realizadas de modo telepresencial.

Os profissionais de educação deverão comparecer ao local indicado pelas escolas para realização de testagem para Covid19, conforme comunicado a ser encaminhado a eles diretamente.

Fica estabelecido e declarado que a retomada das atividades presenciais nas escolas abrangidas neste acordo é facultativa para estas e seus alunos.

2) Medidas protetivas.

  • Fornecimento de luvas descartáveis, protetores faciais (face shields), e outros aparatos necessários para os professores, instrutores e demais profissionais que trabalhem diretamente com alunos da Educação Infantil, por estarem mais sujeitos ao contato com secreções expelidas pelas crianças e, consequentemente, mais expostos ao contágio da Covid-19;

Os gorros, jalecos e aventais serão fornecidos nas situações de alimentação e contato direto com as crianças na higienização delas.

  • Exigir o uso dos EPIs necessários aos trabalhadores (empregados diretos ou terceirizados) obrigatórios para cada tipo de atividade, principalmente para atividades de limpeza, retirada e troca do lixo, manuseio e manipulação de alimentos ou livros e aferição de temperatura;
  • Fornecimento, pelos empregadores, de máscaras aos empregados, adequadas aos graus de risco de contaminação a que o trabalhador estiver exposto e em quantitativo suficiente e que atenda à limitação do período de uso da máscara (vide itens 1.7 e 1.8 do Laudo Pericial de fls. 133/134 da petição inicial da Ação Civil Pública n.º 0000601-86.2020.5.10.0006);
  • Limitação máxima de 50% do contingente máximo de alunos por sala em aulas presenciais, prevista na cláusula 31ª da CCT 2019/2021, respeitada metade do limite máximo de ocupação do espaço de cada sala, nos termos da legislação educacional e o distanciamento de 1,5m entre os alunos;
  • Afastamento imediato de trabalhadores e alunos infectados até a plena recuperação;
  • Afastamento imediato de trabalhadores e alunos que apresentem sintomas da Covid-19, até que se submetam a exame específico que ateste ou não a contaminação.

As medidas estabelecidas nesta cláusula não excluem nem afastam a incidência das medidas gerais e específicas estabelecidas no Decreto 40.939 do governo do Distrito Federal e demais normas sanitárias vigentes, bem como se aplicará o regime sancionatório previsto no art. 10 do referido Decreto, sem prejuízo de ajuizamento de ação pelo Ministério Público do Trabalho ou pelo SINPROEP/DF, em caso de descumprimento do presente acordo por qualquer dos estabelecimentos de ensino por ele afetado, inclusive com a imposição de sanções pecuniárias por tal inadimplência, ou transação extrajudicial.

As medidas até aqui acordadas vigoram até o dia 31 de dezembro de 2020.

3) Testagem da Covid 19. Negócio Processual.

Nos termos do art. 190 do CPC, as partes, incluídos o SINEPE/DF e SINPROEP/DF, neste ato estabelecem negócio processual pelo qual aceitampreviamente, com renúncia a recursos, a sentença parcial remanescente a ser proferida com objeto exclusivo de definição do método de testagem a que deverão ser submetidos os profissionais de educação para o retorno às atividades presenciais, a ser prolatada após a realização de perícia, ficando as partes desde já intimadas para indicarem os quesitos, no prazo de 5 dias úteis, a partir da homologação do presente acordo, na Ação Civil Pública n.º 0000601-86.2020.5.10.0006.

  • Mandado de Segurança. Perda de objeto.

Com a homologação do presente acordo, o presente Mandado de Segurança perderá o objeto.

  • Homologação do acordo. Necessidade de anuência do Distrito Federal.

A homologação do presente acordo depende de anuência do Distrito Federal, que será intimado a se pronunciar, considerando a urgência da medida, em 24h, nos autos da Ação Civil Pública 0000601-86.2020.5.10.0006, presumindo-se a plena concordância em caso de silêncio.

6) Incidentes processuais. Desistência.

Com a homologação do acordo, as partes, inclusive o SINEPE/DF e SINPROEP/DF, desistem de todos os recursos, impugnações, reclamações constitucionais, conflitos de competência, correições parciais e quaisquer outros incidentes fundados em decisão proferida no Mandado de Segurança 0000577-76.2020.5.10.0000 e na Ação Civil Pública 0000601-86.2020.5.10.0006, no prazo de 24h a contar da ciência da homologação.

Os signatários do presente acordo declaram, para todos os efeitos, que o acordo não prejudica o prosseguimento da Ação Civil Pública 0000254-50.2020.5.10.0007 quanto às creches conveniadas ao GDF.

A presente ata documenta também a Ação Civil Pública 0000601-86.2020.5.10.0006, devendo ser inserida nos autos respectivos.”

O acordo parcial, após a anuência expressa do réu, foi homologado (fl. 618).

Designada perícia simplificada, em audiência de instrução, o autor, seu assistente e o amicus curiae apresentaram quesitos (fls. 642/644, 649/650 e 655/657).

Interpostos embargos declaratórios pelo DISTRITO FEDERAL à decisão  homologatória do acordo (fls. 646/647), conhecidos e desprovidos (fls. 651/653).

À audiência designada o perito respondeu oralmente aos quesitos ofertados por escrito e prestou esclarecimentos suplementares, sendo, em seguida, encerrada a instrução (ata às fls. 661/662; link de acesso ao arquivo digital da audiência indicado à fl. 663).

Laudo da assistente técnica do autor juntado às fls. 664/670.

Razões finais por memoriais apresentadas pelo autor, pelo assistente e pelo amicus  curiae (fls. 675/679, 680/684 e 685/687).

II – FUNDAMENTAÇÃO

1. PRELIMINARMENTE. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DE JULGAMENTO

Depois de encerrada a instrução, nova discussão surgiu nos autos: qual seria o exato objeto do julgamento remanescente após a celebração e homologação do acordo parcial celebrado.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO entende que o negócio processual (e, consequentemente, a perícia e o julgamento dele decorrentes) teria por objeto apenas a definição do “tipo de testagem” (fl. 675, item I, 1º §). Pondera que “cumpre rememorar que o negócio processual foi celebrado a partir de impasse existente entre as partes quanto ao Item B.2, ‘5’, da emenda à petição inicial, qual seja: ‘5) Garantia de testagem PCR de todos os profissionais para a efetiva retomada das atividades’ (fl. 676). Pontua que, “caso não houvesse a garantia de que a testagem seria fornecida a todos os profissionais da educação privada previamente ao retorno das aulas presenciais, o MPT não teria anuído com a celebração do acordo processual, haja vista que não haveria a garantia de adoção de qualquer medida preventiva no que se refere à detecção prévia de contaminados, para fins de isolamento e recuperação” (fl. 676).

Já o SINPROEP-DF, assistente do autor, sustenta, de certo modo fazendo coro com o que defende o Parquet, que “o negócio processual celebrado entre as partes assegurou que todos os profissionais de educação devem ser testados previamente para o retorno às atividades presenciais, ficando pendente de definição tão somente a definição do método de testagem a que deverão ser submetidos tais trabalhadores” (fl. 685). Argumenta que, “assim, é imprescindível que a testagem prévia seja garantida a TODOS os trabalhadores, nos exatos termos do acordo entabulado na audiência de conciliação realizada no dia 24 de agosto de 2020, sob pena de acarretar discriminação entre os profissionais da educação e se afastar do objetivo pretendido com a realização dos referidos testes, que é justamente garantir maior segurança para o retorno às atividades educacionais presenciais, com a interrupção precoce da transmissão no ambiente escolar” (fl. 687).

Por fim, a posição do SINEPE-DF, amicus curiae, discrepa da visão do autor e do respectivo assistente, falando em “método de testagem” não necessariamente associado à submissão de todos trabalhadores a determinado teste laboratorial.

Como este julgamento resultou de negócio processual inserido como cláusula do acordo parcial celebrado e homologado, é imprescindível a sua perfeita compreensão para, então, se delimitar o que está em julgamento.

Será ele (e não o teor da petição inicial, da emenda a esta, de documentos ou de quaisquer outras manifestações nos autos) a bússola norteadora dos parâmetros de julgamento a serem considerados.

Eis o inteiro teor da cláusula atinente ao negócio processual (fl. 609):

“3) Testagem da Covid 19. Negócio Processual.

Nos termos do art. 190 do CPC, as partes, incluídos o SINEPE/DF e o SINPROEP/DF, neste ato estabelecem negócio processual pelo qual aceitam previamente, com renúncia a recursos, a sentença parcial remanescente a ser proferida com objeto exclusivo de definição do método de testagem a que deverão ser submetidos os profissionais de educação para o retorno às atividades presenciais, a ser prolatada após a realização de perícia, ficando as partes desde já intimadas para indicarem os quesitos, no prazo de 5 dias úteis, a partir da homologação do presente acordo, na Ação Civil Pública n.º 0000601-86.2020.5.10.0006.”

Pois bem.

Em síntese, cumpre definir se o propósito do diferimento da definição do método de testagem mais adequado para a presente decisão judicial cingir-se-ia a uma questão binária singela (submissão de cada trabalhador ao teste RT-PCR versus submissão de cada trabalhador ao teste sorológico) ou se deveria envolver a descoberta da melhor estratégia para verificação de pessoas infectadas ou suspeitas de contaminação dentre aquelas prestes ao retorno ao trabalho presencial nas escolas particulares do Distrito Federal.

Há, claramente, uma imprecisão terminológica na manifestação do autor. O que se acordou não foi a definição do tipo de teste, mas o método de testagem. O tipo de teste redundaria naquilo que estou chamando de questão binária (RT-PCR ou sorologia?). Poderiam as partes ter-se limitado a tal questão, mas, na liberdade própria da construção dos consensos, preferiram ir além, aderindo à ideia mais ampla de definição do método de testagem.

A admissão patronal da testagem sorológica de todos trabalhadores fez parte dos esforços de construção do consenso, antes de a ele se chegar, mas não figurou expressamente como parte da avença, ao contrário do que supôs o sindicato obreiro assistente em suas razões finais.  

Do mesmo modo, durante os debates, o autor chegou a cogitar explicitamente, com endosso deste magistrado, diga-se de passagem, de reduzir o universo de trabalhadores para testagem pelo RT-PCR àqueles sem sorologia positiva para os anticorpos para a Covid-19, mas tal mitigação da pretensão constante de sua emenda à inicial tampouco constou dos termos do acordo parcial homologado, aí incluída a cláusula atinente ao negócio processual.

“Método” é “caminho para se atingir uma meta” (HOUAISS) ou “1º qualquer pesquisa  ou orientação de pesquisa; 2º uma técnica particular de pesquisa. No primeiro caso não se distingue de ‘investigação’ ou ‘doutrina’. O segundo significado é mais restrito e indica um procedimento de investigação organizado, repetível e autocorrigível, que garanta a obtenção de resultados válidos” (ABBAGNANO).  

Logo, método é inconfundível com tipo ou modalidade – aquele é procedimento; estes são sinônimos de espécies. E, assim, não é possível inferir do negócio processual que o objeto remanescente do julgamento da ação civil pública fosse apenas a indicação do tipo ou modalidade de testagem mais adequada, mas a definição do método mais eficaz para a testagem dos trabalhadores para a Covid-19 do ponto de vista da prevenção da contaminação comunitária.

Registro, por oportuno, não ter havido nenhuma insurgência de qualquer das partes antes ou durante a audiência, mesmo tendo-lhes sido aberta a palavra em vários momentos, inclusive antes do encerramento do ato, quanto aos quesitos apresentados e respondidos, tendo apenas este magistrado indeferido o sétimo quesito do amicus curiae, por impertinência. Assim, não bastasse a clareza do texto da cláusula em debate (negócio processual), operou-se nitidamente a preclusão para agitar qualquer suposta irregularidade na interpretação conferida por este juízo (CLT, art. 795).

No tocante à abrangência subjetiva, não há dúvida de que todos os trabalhadores (empregados e terceirizados) devem passar por este “método de testagem”, já que as partes, como não poderia deixar de ser, explicitamente ajustaram que as medidas adicionais especificadas no acordo não excluíam a incidência inevitável do rol de medidas protetivas enumeradas nos protocolos sanitários do Decreto GDF nº 40.939/2020 e demais normas sanitárias. E, como bem lembrou o autor, em suas razões finais, a testagem dos trabalhadores para Covid-19 está contemplada em tal ato governamental (Anexo Único, item F.15), ainda que de modo inespecífico e fazendo remissão a um outro protocolo sanitário (certamente, fosse o tópico mais preciso e específico, não teria imperado o impasse que resultou no negócio processual ensejador do presente julgamento parcial remanescente e irrecorrível).

Por outro lado, do mesmo modo que o autor aponta que não teria aceito o negócio processual se o seu objeto não pressupusesse (implicitamente) a submissão de todos trabalhadores a um dos testes que nutriram a polêmica residual, é legítimo supor que o sindicato patronal talvez não aceitasse o negócio processual que se restringisse à definição da modalidade do teste laboratorial a que deveriam ser submetidos todos os trabalhadores.

Porém, mais que conjecturas, importa examinar o que foi efetiva e explicitamente ajustado. Ajustado numa paciente construção coletiva consensual não só das condições do acordo, mas também de sua redação, realizada, conferida e corrigida a várias mãos pelos participantes do encontro de mediação do dia 24 de agosto. Todos os interlocutores puderam intervir – e quase todos efetivamente intervieram – na busca do texto exato que merecesse a aceitação de todos os protagonistas envolvidos, presentes à audiência.

Acrescento que as alegações que precederam e permearam as discussões da longa sessão do dia 24 de agosto até poderiam nortear a interpretação, mas somente em caso de obscuridade ou ambiguidade dos termos da conciliação.

Neste ponto, o negócio processual é cristalino, não ensejando dúvida interpretativa.

O acordo, por este magistrado proposto, de modo transparente, como consta do parágrafo introdutório de sua sugestão que acabou redundando na conciliação, fixou como objeto remanescente para julgamento da ação civil pública o método de testagem e não o tipo de teste laboratorial.  

Afinal, estamos a tratar de uma estratégia abrangente de medidas sanitárias de prevenção e contenção da contaminação da comunidade escolar (aí todos incluídos – alunos, familiares, professores, auxiliares, terceirizados, prestadores de serviços e empresários) pelo novo coronavírus. Neste contexto, a submissão de trabalhadores a testes laboratoriais consiste apenas em uma das possíveis medidas preventivas a serem cogitadas e implementadas.

Demonstração tácita (e evidente) de que o próprio autor e seu assistente compreenderam a transcendência da questão do trato do método de testagem, a extrapolar o “binarismo” dos testes mais confiáveis disponíveis no Brasil (RT-PCR ou sorologia), foi a apresentação de quesitos acerca da periodicidade da testagem dos trabalhadores (averiguar se bastaria uma rodada de testes ou se esses testes deveriam ser repetidos com determinado lapso temporal ou dentro de certos parâmetros após o retorno dos empregados às atividades escolares presenciais) bem como a cogitação de associação de estratégias em que a testagem pelo RT-PCR fosse um dos ingredientes – e não o único.

Assim, considerando os precisos termos da avença processual, leal, transparente e objetivamente proposta por este juiz e aceita por todos os envolvidos, rejeito a questão preliminar suscitada pelo autor e pelo respectivo assistente.  

Consequentemente, não está este pronunciamento jurisdicional confinado à declaração de qual teste laboratorial seja o mais eficaz, dentre os disponíveis no Brasil, para prevenção da Covid-19 em relação aos trabalhadores nas escolas particulares em iminente retorno das atividades presenciais no Distrito Federal, mas à revelação e ao reconhecimento do melhor método de testagem para isso.

2. DEFINIÇÃO DO MELHOR MÉTODO DE TESTAGEM

Delimitado o exato objeto de julgamento, resta levantar os dados técnicos trazidos pelo perito e pelo laudo da assistente técnica do autor (durante a audiência a outra assistente técnica, indicada pelo amicus curiae, declarou expressamente sua concordância com as opiniões e informações trazidas pelo perito do juízo, por ela enaltecidas, o que parece justificar a ausência de apresentação de laudo paralelo escrito por ela dentro do prazo propiciado) e a partir daí resolver o objeto remanescente da demanda – a definição do melhor método de testagem com vistas à programação do retorno dos profissionais da educação às atividades pedagógicas, administrativas e auxiliares presenciais nos estabelecimentos particulares de ensino do Distrito Federal.

Como visto pelo inteiro teor do acordo parcial, as escolas, pela voz de seu sindicato na condição de substituto processual (CF, art. 8º, III), reiteraram o inevitável compromisso de atendimento a todos os protocolos genéricos e específicos contemplados no Decreto GDF nº 40.939/2020, além das obrigações complementares concernentes à limitação do número de alunos à metade do máximo indicado na convenção coletiva da categoria e respeitados o distanciamento entre os estudantes e os parâmetros de ocupação nas salas de aula, ao fornecimento e exigência do uso de equipamentos de proteção individual (como luvas descartáveis, máscaras, protetores faciais, gorros, jalecos e aventais) e o afastamento imediato de trabalhadores e alunos infectados até a plena recuperação e de trabalhadores e alunos com sintomas de Covid-19 até submissão a teste.

Assim, bem vistas as coisas, parte do objeto remanescente do presente julgamento já está em alguma medida contemplada no acordo parcial homologado: na hipótese de trabalhadores infectados ou sintomáticos para Covid-19, deve o empregador afastá-los imediatamente até que se recuperem ou se descarte o diagnóstico de possível contaminação.

Em relação aos trabalhadores com suspeita de contaminação, resta pontuar que, ao que indicou incisivamente o perito judicial, o único teste útil e eficaz para detecção ou confirmação diagnóstica é o RT-PCR. Não tendo o acordo tratado de modo específico do tipo de teste nem da responsabilidade pelo seu custeio, assinalo que deverão as escolas, nesta situação de suspeita de contaminação, custear o teste RT-PCR até 31 de dezembro de 2020, sem prejuízo de eventual extensão da vigência das obrigações contidas nesta decisão, em ação revisional, caso se mantenha ou se agrave a situação epidemiológica da Covid-19 nesta unidade da federação.  

Condeno as escolas a tal obrigação adicional, portanto.

Por outro lado, não se preocuparam os protagonistas desta ação civil pública, corretamente, em dirigir qualquer questionamento ao perito acerca dos trabalhadores integrantes de grupos mais vulneráveis aos efeitos mais sérios da contaminação pela Covid-19 porque os empregadores já estão proibidos de lhes exigirem o trabalho em regime presencial (Decreto GDF nº 40.939/2020, art. 5º, IV).  Logo, tais trabalhadores, com o retorno das atividades presenciais, devem prosseguir em atividades remotas de modo a poderem observar a orientação de seu rigoroso distanciamento social.

Assim, o alvo residual central do presente julgamento é a definição do método de  testagem dos empregados não infectados, assintomáticos e que não integrem os chamados grupos de risco, pois os empregados infectados ou com sintomas de Covid-19 e os empregados vulneráveis a impactos orgânicos mais perigosos no caso de contágio viral devem ser afastados ou mantidos em confinamento residencial até a plena recuperação (no caso de infectados) ou a exclusão diagnóstica (no caso de suspeita de infecção) ou de reorientação das autoridades sanitárias (quanto aos grupos de risco).

A perícia simplificada (oral) foi extremamente elucidativa. Na apresentação inicial e nas respostas aos quesitos, deixou bem claro o perito que o teste padrão-ouro para detecção de pessoas com infecção ativa pelo novo coronavírus (SARSCoV-2 ou Covid-19) é o RT-PCR (sigla em inglês para "reverse transcription polymerase chain reaction"), como sustentaram o autor e o respectivo assistente.  

Também foi contundente o expert ao assinalar a inutilidade do teste sorológico para constatação de pessoas contaminadas, enfatizando que só serviria tal exame como instrumento de inquéritos epidemiológicos para formulação ou revisão de políticas públicas na área de saúde ou para confirmação de diagnóstico de contaminação pretérita quando a pessoa, com sintomas compatíveis com a Covid-19, não tenha feito o teste ou seu PCR tenha dado negativo.

Portanto, entre os dois tipos de testes laboratoriais disponíveis no país para detecção da Covid-19, esclareceu o perito que o único indicado como medida preventiva é o RT-PCR (altamente sensível – 75% – e com 99,5% de especificidade).

Contudo, com a mesma clareza, informou o perito do juízo que não há na literatura  científica respaldo para testagem em massa de indivíduos assintomáticos para averiguação da contaminação pelo SARS-CoV-2, seja pelo percentual mínimo de pessoas contaminadas (em torno de 1%), seja pelo incômodo físico trazido pela coleta da secreção naso-orofaringe, seja pelo impacto psicológico de falsos positivos (gerados por contaminação da amostra por alguma falha na manipulação do material pelo laboratório) e de falsos negativos (pela defasagem entre o momento do contágio e disseminabilidade do vírus e o instante de detectabilidade laboratorial do vírus).

Em outras palavras, a positividade no exame pode esconder um erro laboratorial que trará enorme ansiedade e angústia a alguém sadio e a negatividade do exame não exclui que o paciente examinado não esteja infectado, com ou sem sintomas peculiares, ensejando-lhe um enganoso sossego.

Lecionou o perito que “todo teste deve ser dirigido a um indivíduo que tenha uma chance pré-teste razoável” (declaração aos 30’-31’ da audiência de perícia simplificada) e que “o teste é sempre o RT-PCR, mas a triagem de indivíduos assintomáticos que não tenham quadro clínico ou exposição documentada não tem validação na literatura”. A testagem em massa como estratégia isolada traduz-se, segundo relatou, em uso fútil do exame, sem falar na sua condição desagradável e psicologicamente desgastante e no já comentado risco de falsos resultados.

Também destacou o perito que há muitas variáveis nos efeitos do vírus sobre diferentes organismos. Assim, entre 8% e 10% dos indivíduos contaminados pelo novo coronavírus não desenvolvem anticorpos dosáveis depois de infectados, o que é mais comum em pacientes com sintomas leves (ou seja, terão teste sorológico negativo para infecção pretérita, efetivamente ocorrida). Por outro lado, normalmente, a partir do segundo ou terceiro dia após a contaminação, a pessoa já começa a excretar o vírus, o que se prolonga entre 6 e 8 dias, ou seja, após 10 dias o vírus, ainda que presente no corpo, não infecta mais as pessoas contactantes (há indivíduos que continuam com o vírus por mais tempo, ainda que em inatividade), sendo que o RT-PCR somente é capaz de detectar a infecção alguns dias após o início da contagialidade do novo coronavírus.

Daí a conclusão pericial de que “a melhor estratégia é a testagem dirigida”, ou seja, “o mais prudente é testar de maneira dirigida [...]. Todos indivíduos com qualquer sintoma compatível com Covid devem ser afastados e testados e retornarem só caso os sintomas não sejam típicos, com o teste negativo, ou com sintomas típicos depois de passado todo o período, independentemente do resultado do teste”.

Em contraste parcial aos esclarecimentos do perito do juízo, o laudo da assistente técnica do autor pontua que, a depender das circunstâncias específicas de cada estabelecimento, o CDC (órgão norte-americano incumbido da orientação à sociedade dos Estados Unidos quanto a questões de saúde pública, considerado referência mundial no trato das políticas públicas concernentes ao novo coronavírus, sendo a fonte principal dos subsídios trazidos pelo perito do juízo e pela assistente técnica do autor) indicaria a necessidade de testagem periódica dos professores (fl. 666). Contudo, consultando o respectivo sitio na internet, constato orientação bem diferente.

Eis o que se extrai de tal sítio, especificamente em relação ao retorno das atividades presenciais nas escolas (para mais fácil compreensão trouxe a versão em castelhano disponível ali –undefined Acesso em 12.9.2020):

“Los CDC no recomiendan la realización de pruebas en la modalidad

universal a todos los estudiantes y personal, por varios motivos:

 Las pruebas virales solo permiten saber si la persona tiene COVID-19 al momento de la prueba.

 La modalidad de pruebas universales o únicas podría no detectar casos de COVID-19 en las etapas iniciales de la infección y, por consiguiente, tampoco permitiría detectar la exposición posterior a las pruebas.

 Implementar una modalidad universal de pruebas de detección en escuelas puede presentar dificultades como la falta de la infraestructura necesaria para la realización de pruebas de rutina y su seguimiento en el entorno escolar, no saber si todos los estudiantes, padres y personal aceptarían este abordaje, la falta de recursos especializados, consideraciones prácticas relacionadas con las pruebas de detección a menores de edad y las posibles disrupciones que esto podría causar en el ámbito educativo.”

Portanto, sem desmerecer o esmero do trabalho da assistente técnica ministerial, percebe-se que, conforme a principal fonte científica por ela lembrada e inspiradora central das informações trazidas pelo perito do juízo, a testagem em massa instantânea ou periódica não traz nenhum benefício expressivo, inclusive por ocasião do retorno às atividades escolares presenciais. Afinal, o teste é, mal comparando, uma fotografia que pode distorcer a realidade viral do indivíduo testado já que, como demonstrado pelo perito judicial, há um hiato temporal entre o início da contaminação e a data de detectabilidade do vírus. Assim, um teste negativo não confere tranquilidade à pessoa, seja pelo risco futuro constante de contaminação, seja por já poder estar infectada a pessoa no momento em que se submete ao exame.

Logo, convenci-me da lucidez, precisão, atualidade e cientificidade do pronunciamento denso oral do perito do juízo, guia fundamental da presente decisão.

Assim, sopesando o conjunto de preciosas informações trazidas pelo perito, conclui-

se que o método de testagem ideal, nas condições atuais, visando a preparação dos trabalhadores da educação para o retorno às atividades presenciais, na rede particular de ensino candanga, não pode cingir-se à realização de testes de detecção instantânea, mas em procedimento preparatório que passe, em relação aos indivíduos assintomáticos não integrantes de grupos de risco (insisto que os trabalhadores infectados ou com sintomas devem ser afastados imediatamente e, no caso de retorno às atividades presenciais, devem ter a sua volta adiada até a confirmação diagnóstica e, se for o caso, tratamento e plena recuperação), por uma ou duas etapas:

1ª) o levantamento do perfil clínico-epidemiólogico individual de cada trabalhador para apurar, mediante autodeclaração ou por observação de outrem, se:

  • apresenta qualquer dos sintomas sugestivos de contaminação

pela Covid-19 (como febre, tosse, indisposição física, diarreia, coriza ou dificuldade respiratória);

  • esteve em contato domiciliar ou em qualquer lugar, por no mínimo15 minutos e a menos de 2 metros, com pessoas infectadas, nos últimos catorze dias;
  • frequentou alguma aglomeração sem proteção e distanciamento recomendáveis, nos últimos catorze dias;

2ª) apurada a ocorrência de qualquer das hipóteses acima, o empregado deve ser afastado do trabalho e submetido imediatamente ao teste RT-PCR e somente deve ser considerada descartada a infecção mediante diagnóstico combinado entre o exame clínico-epidemiológico por médico e o resultado do exame laboratorial, podendo, neste caso de exclusão diagnóstica, o trabalhador ser convocado a retornar ao trabalho;

3ª) ausente qualquer das hipóteses indicadas na primeira etapa, poderá o trabalhador voltar ao trabalho presencial.

O sindicato obreiro, em suas razões finais, sinaliza a preocupação com a subnotificação de tais situações sugestivas de possível contaminação pela Covid-19 dado o fundado temor dos professores quanto a represálias.

O argumento deve ser considerado, mas também não se pode desprezar que:

  • se trata de categoria não só extremamente organizada, mas consciente (até porsua profissão e formação acadêmica e cultural acima dos padrões médios nacionais) de seus direitos e deveres individuais e coletivos e da importância da sinceridade na notificação de situações sugestivas de possível contaminação pelo novo coronavírus, não só no interesse das escolas, mas no interesse seu e de sua família pela preservação de sua saúde e da saúde de seus entes queridos, dos alunos com quem convive e respectivas famílias e de toda comunidade exposta toda vez que alguém suspeito de infecção não se isola socialmente de imediato, realimentando a escalada de contágio da SARS-CoV-2 e frustrando as expectivas de normalização sanitária;
  • as escolas não devem ter nenhum interesse nessa ocultação de informações,pois qualquer episódio de infecção comunitária em seu interior pode redundar em grandes danos não só à saúde de outros profissionais, alunos e seus familiares e amigos, como também à imagem do estabelecimento, suscetível inclusive de interdição e pesadas multas administrativas segundo as regras do decreto distrital que disciplina a reabertura do comércio e das instituições de ensino; escolas, profissionais da educação, pais, alunos e comunidade devem estar no mesmo barco nesta questão da obrigatoriedade e imediatidade da notificação de suspeita ou de confirmação de diagnóstico de infecção; sem essa solidariedade e senso de responsabilidade e cooperação o retorno às aulas presenciais seria um total desastre sanitário e social;
  • a eventual dispensa imotivada em tais circunstâncias ostenta caráter indisfarçavelmente discriminatório que enseja a possibilidade de reintegração e de reparação de danos materiais e extrapatrimoniais a favor da vítima.

Enfim, como visto, hão de ser adotadas medidas preventivas de caráter universal onde a testagem pelo RT-PCR constitui providência complementar importante, mas não única nem necessariamente prioritária, suficiente ou eficaz. A universalidade das medidas preventivas concernentes à detecção da presença da Covid-19, mediante exame individual das condições clínicoepidemiológicas de cada trabalhador a retornar às atividades presenciais, integra, como não poderia deixar de ser, o conjunto de obrigações estipuladas na presente decisão como modo de máxima segurança do ambiente do trabalho e de preservação da saúde, da integridade física e psíquica e da vida não só dos trabalhadores (empregados, terceirizados e prestadores de serviços permanentes ou eventuais) nas escolas particulares do Distrito Federal, mas da comunidade acadêmica como um todo, seus familiares e toda a sociedade (CF, arts. 6º, 7º, XXII, e 196).

Por fim, nunca é demais realçar que, no âmbito das tutelas coletivas, pode o Judiciário adotar medidas específicas que atendam o relevante interesse metaindividual subjacente (aqui congregando o interesse difuso atrelado à saúde da população com o direito coletivo dos trabalhadores e alunos e ainda os direitos individuais homogêneos concernentes à prevenção dos riscos à saúde de cada empregado isoladamente considerado), assegurando o resultado prático perseguido (CDC, art. 84, caput), inclusive mediante a imposição de multa de oficio para o caso de descumprimento da ordem judicial (CDC, art. 84, § 4º).

Assim, a partir das condições do acordo parcial homologado e dos subsídios da prova técnica produzida em audiência, concluo que todos trabalhadores (empregados, inclusive terceirizados) devem ser avaliados individualmente para verificação da possibilidade ou não de seu imediato retorno às atividades presenciais, pelo que os estabelecimentos particulares de ensino abrangidos pela presente ação civil publica ficam obrigados a observar o seguinte:

  • os trabalhadores já em gozo de licença remunerada ou previdenciária porinfecção confirmada pelo novo coronavírus permanecerão afastados do trabalho até a plena recuperação (isolamento), atestada por perito do INSS, médico do trabalho da empresa ou médico por ela custeado;
  • os trabalhadores comprovadamente infectados ou com sintomas compatíveis coma Covid-19 não poderão retornar (quarentena), devendo ser submetidos ao teste RTPCR, se ainda não o fizeram, às expensas do empregador, e, após avaliação clínica por médico, serão mantidos afastados até a plena recuperação ou liberados para o trabalho, sendo a contaminação descartada pelo médico do trabalho da empresa ou médico por ela custeado;
  • os trabalhadores que estiveram nos últimos 14 dias, contados da data de suaavaliação médica, com pessoas infectadas, seja em sua própria casa, seja em qualquer espaço onde a pessoa contaminada estivesse a menos de dois metros e um deles ou ambos sem as proteções sanitárias recomendáveis, devem ser imediatamente afastados (quarentena), devendo ser submetidos ao teste RT-PCR às expensas do empregador e, após avaliação clínica por médico, serão mantidos afastados até a plena recuperação ou liberados para o trabalho, sendo a contaminação descartada pelo médico do trabalho da empresa ou médico por esta custeado;
  • os trabalhadores que estiveram, sem o distanciamento ou a proteção sanitáriarecomendável, em aglomeração nos últimos 14 dias contados de sua avaliação médica, devem ser imediatamente afastados, devendo ser submetidos ao teste RTPCR às expensas do empregador e, após avaliação clínica, serão mantidos afastados até a plena recuperação ou, sendo a contaminação descartada pelo médico do trabalho da empresa ou médico por esta custeado, liberados para o trabalho;
  • os trabalhadores não infectados e assintomáticos só poderão retornar àsatividades presenciais após a avaliação prévia individual favorável das condições clínico-epidemiológicas especificadas nesta decisão, mediante exame médico e, enquadrados em qualquer das hipóteses de possibilidade de infecção, após a conclusão do teste RT-PCR, correndo às expensas exclusivamente das escolas as consultas médicas e os testes laboratoriais, se não tiverem serviço próprio ou convênio gratuito para os trabalhadores; as escolas deverão comunicar previamente aos trabalhadores se oferecerão diretamente o serviço de atendimento médico e laboratorial, indicando a data, hora e local para tanto, ou se poderão os trabalhadores buscar tal atendimento mediante reembolso imediato integral das despesas com consulta e exame específico;
  • constatado por médico que o trabalhador integra qualquer dos grupos derisco mais vulneráveis aos efeitos da Covid-19, deverá ser solicitado ao médico atendente atestado, relatório ou declaração de tal circunstância, que deverá ser imediatamente entregue ao empregador, hipótese em que o trabalhador não retornará às atividades presenciais enquanto perdurar a orientação de distanciamento social das pessoas em tal condição pelas autoridades sanitárias;
  • os estabelecimentos particulares de ensino do Distrito Federal deverão realizardiariamente, nos dias em que haja o comparecimento de trabalhadores na instituição, a atualização das condições clínico-epidemiológicas de cada trabalhador, mediante formulário simplificado objetivo ou enquete para averiguação permanente da existência de qualquer das situações indicativas da possibilidade de contaminação pelo novo coronavírus, a ser respondido por cada trabalhador por escrito ou em sistema eletrônico, antes do inicio de suas atividades laborais, devendo tais empregados ser afastados imediatamente caso informem qualquer de tais situações até a confirmação diagnóstica e, se for o caso, tratamento e recuperação;
  • sentindo o trabalhador, fora do horário de trabalho ou após a resposta aoformulário ou enquete clínico-epidemiológica, qualquer sintoma sugestivo de infecção pelo SARS-CoV-2 ou tendo ciência da infecção pelo novo coronavírus de pessoa com quem conviva sob o mesmo teto ou com quem tenha tido contato por mais de 15 minutos e sem observar a distância mínima de dois metros nos catorze dias imediatamente anteriores, deverá comunicar imediatamente tal fato ao empregador que deverá afastá-lo imediatamente e encaminhá-lo para médico do trabalho da empresa ou médico por esta custeado ou conveniado, sem ônus para o trabalhador, e, se houver prescrição médica, para laboratório para testagem pelo RT-PCR, sempre às expensas do empregador; a comunicação poderá ser feita ao empregador por qualquer parente do trabalhador ou pelo sindicato profissional, caso esteja impossibilitado de fazê-lo;
  • havendo indicação de necessidade do exame RT-PCR por médico procurado por

iniciativa do trabalhador, o empregador custeará integralmente o valor do teste, podendo este indicar o laboratório onde deva comparecer o empregado; caso o empregado faça o teste em outro estabelecimento, o empregador reembolsará as despesas incorridas, até o limite do valor do mesmo exame no laboratório por ele indicado, até o pagamento do salário do mês subsequente ao da apresentação da nota fiscal;

  • a inobservância das determinações contidas nesta decisão, inclusive quanto ao custeio das despesas médicas e laboratoriais e ao monitoramento diário das condições clínico-epidemiológicas dos trabalhadores, constitui falta grave do empregador ensejadora da rescisão indireta do contrato de trabalho e de reparações por danos materiais, morais e existenciais (CLT, arts. 157 e 483, a, c e d), dentre outras consequências;
  • a falsidade ou ocultação de informações clínico-epidemiológicas relevantes ou anegligência na atenção às medidas de proteção estabelecidas nesta decisão constitui falta grave do empregado (CLT, arts. 158, parágrafo único, e 482, b, e e h);
  • será considerada presumidamente discriminatória a dispensa sem justa causa deempregados afastados por infecção ou suspeita de contaminação pelo novo coronavírus ou que tenham notificado tais fatos, pessoalmente, por algum parente ou pelo sindicato profissional ou ainda caso tenham os trabalhadores anotado qualquer situação sugestiva de contaminação no formulário epidemiológico diário aplicado pelo empregador, cabendo a este a prova em contrário do caráter discriminatório da despedida;
  • a gratuidade das consultas médicas e dos testes de RT-PCR a que tiverem deser submetidos os trabalhadores, nos termos desta decisão, será assegurada ate 31 de dezembro de 2020, sem prejuízo de eventual extensão da vigência das obrigações contidas nesta decisão, em ação revisional, caso se mantenha ou se agrave a situação epidemiológica da Covid-19 nesta unidade da federação, correndo por conta exclusiva do empregador as respectivas despesas;
  • sem prejuízo de outras sanções e consequências trabalhistas, previdenciárias,administrativas, cíveis e criminais, incorrerá o empregador que descumprir qualquer das obrigações estipuladas nesta decisão em multa entre R$ 1.000,00 e R$ 100.000,00, por infração e por trabalhador prejudicado, a ser arbitrada judicialmente em execução individual contra o respectivo estabelecimento infrator, conforme a gravidade, extensão e reincidência da desobediência aos termos desta sentença, cabendo ao autor da ação de execução indicar a destinação dos recursos, preferencialmente para ações de controle e prevenção da Covid-19, enquanto vigorar o estado de calamidade pública pelo reconhecimento de emergência de saúde pública de importância internacional.

Julgo procedente em parte o pedido remanescente pendente de apreciação,

condenando os estabelecimentos particulares de ensino do Distrito Federal a cumprirem as obrigações estabelecidas no corpo desta decisão.

3. HONORÁRIOS PERICIAIS

Considerando o valor proposto pelo profissional e o nível de excelência do trabalho técnico desempenhado, acolho sua sugestão para arbitrar os honorários periciais em R$ 2.000,00.

Como apenas o autor, o respectivo assistente e o amicus curiae celebraram o negócio processual que resultou neste julgamento e o pedido inicial residual foi acolhido, ainda que parcialmente, condeno o SINEPE-DF a pagar a verba honorária pericial à vista de sua sucumbência na pretensão objeto da perícia.

 

Dispositivo

ISTO POSTO, julgo PROCEDENTE EM PARTE o pedido remanescente da ação civil pública, nos termos da fundamentação que integra o presente dispositivo para todos os efeitos e fins.

Honorários periciais, no importe de R$ 2.000,00, pelo SINEPE-DF.

Custas, pelo SINEPE-DF, no importe de R$ 200,00, calculadas sobre R$ 10.000,00, valor arbitrado à condenação, a serem recolhidas em cinco dias.

Sentença irrecorrível por deliberação consensual das partes, não sendo suscetível de embargos de declaração, recurso que são (CPC, art. 994, IV).

Em nome da total transparência e clareza dos atos jurisdicionais, em caso de necessidade será aceito pedido de esclarecimentos sem efeito infringente, suspensivo nem interruptivo, a ser apresentado no prazo preclusivo de cinco dias.

Publique-se para ciência do assistente do autor e do amicus curiae.

Intimem-se o autor e o réu via sistema.

BRASILIA/DF, 13 de setembro de 2020.

ANTONIO UMBERTO DE SOUZA JUNIOR

Juiz do Trabalho Titular

Decisão do STJ reconhece fraude à execução em venda de bem de sócio, mesmo quando em curso apenas a ação judicial contra a empresa

A 4ª Turma do STJ concluiu pela existência de fraude à execução na venda de uma fazenda pelo único dono da empresa devedora, em alienação realizada antes da desconsideração da personalidade jurídica determinada no cumprimento de sentença de ação de cobrança. Compreendeu que o sócio tinha conhecimento da ação de cobrança, pois a citação da empresa foi feita na pessoa do sócio (processo REsp 1763376).

A decisão foi tomada em recurso originado em ação de embargos de terceiro, ajuizada pela empresa que adquiriu o imóvel do sócio e que alegou ter agido de boa-fé.

A decisão é relevante, pois destaca a importância de o comprador de um bem, principalmente de maior valor, analisar a situação financeira e jurídica do vendedor, evitando problemas futuros. É necessário avaliar, assim, não apenas a situação jurídica e as ações judiciais em nome do vendedor, mas também das empresas que ele integra.

É importante destacar que a boa-fé do comprador é irrelevante no caso de fraude à execução, diferentemente do que acontece com a fraude contra credores. Na fraude contra credores, o ato pode ser anulado, pois se verifica que o devedor, de má-fé, aliena seu patrimônio para se esvair da cobrança judicial. É necessário, nesse caso, a demonstração do dolo do devedor. Já no caso da fraude à execução, é necessário que a venda do imóvel tenha ocorrido após instaurada a cobrança judicial, impedindo com isso a satisfação da dívida, sendo irrelevante o dolo do devedor.

A fraude contra credores, portanto, é ato de maior reprovabilidade social e leva, sendo o entendimento da maioria dos civilistas – ainda que com divergências – à anulação do negócio jurídico, e não apenas a ineficácia perante o credor interessado. Já a fraude contra a execução, se reconhecida, mantém o ato de alienação, que apenas em relação ao credor interessado se torna ineficaz.

A fraude contra credores é um instituto de direito material, ao passo que a fraude à execução é de direito processual e pode ser alegada incidentalmente no processo.

Trabalhadores e empregadores, fiquem atentos!

STF e TST julgam questões relevantes dos trabalhadores de Conselhos Profissionais

O STF encerrou uma grande controvérsia em julgado recente. O plenário da Corte julgou a ADC 36, a ADI 5367 e a APDF 367, para declarar que os trabalhadores dos conselhos profissionais são regidos pela CLT, ou seja, não estão submetidos ao regime estatutário. Houve quatro votos pela inconstitucionalidade do regime celetista e um voto por uma inconstitucionalidade parcial, mas prevaleceu o entendimento da constitucionalidade. O voto vencedor, que foi a divergência do Ministro Alexandre de Moraes, foi no sentido de que os conselhos profissionais, ainda que recebam valores compulsórios e sejam instituídos por lei, não estão sujeitos às mesmas exigências dos entes públicos em sentido estrito.

Por outro vértice, em julgado também recente, a SDI-2 do TST concluiu que uma empregada de um Conselho Profissional deveria ser reintegrada ao emprego, pois sua despedida foi imotivada e não foi procedida de um processo administrativo interno para apuração dos fatores que motivaram a ruptura do contrato, ainda que esses fatores não caracterizem falta grave, à luz da CLT. O relator do acórdão foi o Ministro Douglas Alencar Rodrigues (Processo RO 8903-28.2012.5.02.0000).

Vale lembrar que ainda que o regime seja celetista, os Conselhos Profissionais estão sujeitos ao ingresso de pessoal por prévio concurso público, e é justamente esse concurso, entre outras razões, que leva à conclusão de necessidade de motivação da despedida.

Conselhos Profissionais são entidades criadas por lei, também chamadas de autarquias corporativas, e que tem como objetivo fiscalizar o exercício de determinadas profissões, entre outras atribuições. Alguns exemplos de Conselhos Profissionais são o CFM, CFP, CFO, COFEN, entre tantos outros, e geralmente são instituídos em nível federal e estadual.

Trabalhadores e empregadores, fiquem atentos!

Decisão do TST anula pedido de demissão de trabalhadora grávida, por ausência de assistência sindical

A gestante tem direito à garantia provisória de emprego da confirmação da gestação até 5 (cinco) meses após o parto, conforme prevê o ADCT (Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, artigo 10, inciso II, alínea “b”).

Isso quer dizer que ela não pode pedir demissão?

Há quem entenda que não, sob o fundamento de que o direito seria irrenunciável.

Ocorre que a gestante, ainda que sob o manto da proteção do ordenamento jurídico, não perde sua capacidade civil, ou seja, não pode ser obrigada a se manter num emprego que não deseja mais.

Desse modo, pelo menos em tese é possível o pedido de demissão da gestante.

São comuns, contudo, pedidos de anulação de pedidos de demissão de gestante, em razão de vício de consentimento, como erro, dolo ou coação.

A 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho declarou nulo o pedido de demissão de uma trabalhadora gestante. No caso concreto, o pedido foi formulado e a rescisão foi paga sem qualquer assistência sindical (Processo RR-1000987-93.2018.5.02.0038).

Compreendeu o julgado, de relatoria do Ministro Caputo Bastos, que a gestante, por ter garantia provisória de emprego, deveria ter seu pedido de demissão homologado/assistido pela entidade sindical, na forma do artigo 500 da CLT.

A decisão é inovadora, pois o artigo 500 da CLT se dirige precipuamente à figura do empregado estável por ter mais de 10 anos na empresa e não ser optante pelo FGTS, figura praticamente não mais existente no Brasil, haja vista o decurso de tempo após a CF/88 e a instituição do FGTS.

A cautela envolvendo a rescisão contratual da trabalhadora gestante é sempre o melhor, seja para a gestante, seja para o empregador.

Vale lembrar que para os trabalhadores em geral não mais é exigida a homologação da rescisão pelo ente sindical, mesmo em contratos de trabalho com mais de 1 (um) ano de duração, em razão da revogação do artigo 477, parágrafo 1º, da CLT, pela lei 13467/17 (Reforma Trabalhista).

 

Revisão de Acordos Judiciais

A  8ª Turma do TST concluiu que não é possível rever cláusula de acordo relativa a multa pelo não pagamento ou pagamento em atraso das parcelas de um acordo.

No caso concreto, houve o pagamento do acordo, mas com atraso, tendo o Juiz de Primeiro Grau e o Tribunal Regional rechaçado a possibilidade de aplicação da multa.

Segundo a decisão de relatoria da Ministra Dora Maria da Costa, a decisão homologatória do acordo faz coisa julgada, sendo imutável (art. 5, XXXVI, CF), e que o artigo 879, parágrafo 1º, da CLT, prevê que não se poderá modificar a sentença liquidanda.

A decisão concluiu que “o Regional, ao concluir indevida a multa controvertida, violou a coisa julgada, haja vista que, conforme supramencionado, o título executivo judicial expressamente consignou a incidência da multa em caso de descumprimento do acordo, cabendo-se registrar que não se pode interpretar título judicial, mas apenas cumprir o respectivo comando” (Processo 1576-07.2015.5.17.0001).

A questão do cumprimento dos acordos judiciais tem sido ventilada ultimamente, em razão das dificuldades econômicas oriundas da pandemia. Chegou a ser inserido no texto da Medida Provisória uma previsão de parcelamento dos acordos judiciais em 60 (sessenta) parcelas, mas a medida provisória acabou caducando.

Trabalhadores e empregados, fiquem atentos!

Segue o texto da decisão: 

 

 

PROCESSO Nº TST-RR-1576-07.2015.5.17.0001

RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO. ATRASO NO PAGAMENTO DE PARCELAS DE ACORDO

JUDICIAL. MULTA. OFENSA À COISA JULGADA CONFIGURADA. A imutabilidade da coisa julgada material é protegida pelo inciso XXXVI do art. 5° da CF. Logo, uma vez proferida a decisão de mérito, transitada em julgado, perfeita se torna a coisa julgada material, gozando o comando sentencial de plena eficácia, e sendo inalterável pela via recursal, pois já se encontra esgotada. O Regional, ao concluir indevida a multa prevista em acordo judicial, violou a coisa julgada, haja vista que o título executivo judicial expressamente consignou a incidência da multa em caso de descumprimento do acordo, cabendo-se registrar que não se pode interpretar título judicial, mas apenas cumprir o respectivo comando. Recurso de revista conhecido e provido

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso

de Revista n° TST-RR-1576-07.2015.5.17.0001, em que é Recorrente ADAO FERNANDES PASSOS e são Recorridos F.L BRANDAO - ME, BELARMINO DUARTE BRANDAO e METALURGICA FELIPE LTDA - ME.

O Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região,

mediante o acórdão prolatado às fls. 471/474, negou provimento ao agravo de petição interposto pelo exequente.

Inconformado, Adão Fernandes Passos interpôs recurso

de revista postulando a reforma do julgado.

Pela decisão de fls. 516/517, o recurso foi recebido,

por possível ofensa ao art. 5º, XXXV, da CF.

Não foram apresentadas contrarrazões.

Dispensada a remessa dos autos à Procuradoria-Geral

do Trabalho, nos termos do art. 95 do RITST.

É o relatório.

OTO

I - CONHECIMENTO

Preenchidos os pressupostos comuns de admissibilidade

recursal, examinam-se os específicos do recurso de revista.

EXECUÇÃO. ATRASO NO PAGAMENTO DE PARCELAS DE ACORDO JUDICIAL. MULTA. OFENSA À COISA JULGADA CONFIGURADA.  

Eis os fundamentos adotados pelo Regional:

2.2.1. MULTA POR DESCUMPRIMENTO DO ACORDO.

ATRASO NO PAGAMENTO DE PARCELAS

A r. decisão agravada foi proferida nos seguintes termos:

O exequente requer a aplicação da multa em razão do inadimplemento do acordo firmado nos termos da ata de Id d250987.

Por sua vez, o reclamado informa que não deixou de pagar o acordo nos dias acertados, não por sua maldade e simplesmente porque não quis, mas sim porque é autônomo e está vivendo do seu trabalho e muitas vezes não tinha dinheiro para honrar o compromisso no dia, mas sempre se esforçou para honrar o compromisso, como de fato aconteceu, ainda que com alguns dias em atraso (Id 1085d39).

No caso, restou consignado que incidiria multa de 50% em caso de inadimplemento do acordo, incidente sobre o saldo remanescente (Ata de Id d250987).

Na hipótese destes autos, a pretensão do exequente em ver aplicada a multa não prospera, pois a penalidade se justificaria em caso de inadimplemento, o que, de fato, não ocorreu, já que, como dito, a execução foi quitada integralmente, embora com alguns dias de atraso em relação a cada parcela do acordo.

Registra-se que o objetivo da multa moratória é assegurar o ressarcimento dos prejuízos advindos do não cumprimento da obrigação, bem como pressionar o devedor recalcitrante a cumprir a condenação, e não o de ser aplicada indistintamente.

No presente caso, aflora-se os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade como meios a serem sopesados pelo magistrado, que deve privilegiar a boa conduta do executado em detrimento da penalidade.

Assim, entendo que a avença foi adimplida, o que não justifica a aplicação da penalidade nos moldes pretendido pelo exequente, devendo, no entanto, incidir juros e correção monetária sobre as parcelas pagas com atraso, como forma de compensar o exequente pelo atraso.

Registra-se que para o cálculo deverá ser observada a quantidade efetiva de dias atrasados em relação as datas do acordo de parcela e aplicados juros e correção neste período.

Encaminhem-se os autos à Contadoria para cumprir a determinação, devendo observar os recibos digitalizados pela secretária e juntados aos autos, comparando-o com as datas de vencimento fixadas no acordo (id d250987).

Após, notifique-se o executada para pagamento em 05 dias.

Cumpra-se.

O autor agrava de petição pretendendo a reforma da r. decisão que absolveu a executada do pagamento de multa prevista no termo de acordo homologado em Juízo para hipótese de atraso no pagamento das parcelas do referido ajuste.

Diz, em síntese, que a não aplicação da multa prevista em acordo homologado viola o art. 5º, XXXVI, da CF, devendo, portanto, ser observado, já que as parcelas do acordo foram pagas com atrasos que variaram de 1 a 8 dias, à exceção apenas da 12ª parcela, paga na data fixada no acordo.

Vejamos.

O exequente e o executado firmaram o acordo (Id d250987) nos autos, por meio do qual ficou ajustado que a empresa ré pagaria ao reclamante o valor de R$24.000,00, em 24 parcelas, por depósito nas datas fixadas no acordo. No caso de descumprimento, o executado pagaria multa de 50% sobre o saldo remanescente, assim como vencimento antecipado das parcelas vincendas.

Verifica-se que a ré atrasou o pagamento de 23 das 24 parcelas acordadas.

Por reiteradas vezes foi determinada a expedição de mandado de verificação com a intimação do executado para comprovar o depósito. Em todas as diligências, o executado comprovou ao Oficial de Justiça a efetivação do depósito da quantia devida ao reclamante na parcela perseguida, conforme se verifica dos autos.

De fato, o executado atrasou o pagamento do valor acordado com o reclamante em sucessivas parcelas, pois deveria ter providenciado o depósito das respectivas quantias em cada dia estabelecido no acordo como vencimento das parcelas.

Todavia, não há falar em inadimplência. Todas as parcelas foram quitadas, ainda que com atraso, que variaram de 1 a 8 dias. Assim, ainda que não observada a data do vencimento a rigor, o acordo foi quitado integralmente.

Ante o exposto, comungo da r. decisão de origem quanto à não aplicação da multa, bem ainda adequada a incidência de juros e correção monetária sobre in casu as parcelas pagas com atraso.

Diante do exposto, nego provimento.” (fls. 472/474)

O exequente, fls. 496/514, sustenta, em síntese, que

o atraso no pagamento das parcelas relativas ao acordo judicial acarreta, necessariamente, a aplicação da multa também prevista no referido instrumento, sob pena de ofensa à coisa julgada. 

Indica violação do art. 5º, XXXVI, da Constituição e

traz arestos. 

Ao exame. 

Pois bem, a imutabilidade da coisa julgada material

é protegida pelo inciso XXXVI do art. 5° da CF.

Logo, uma vez proferida a decisão de mérito,

transitada em julgado, perfeita se torna a coisa julgada material, gozando o comando sentencial de plena eficácia, e inalterável pela via recursal, pois já se encontra esgotada.

Por sua vez, o artigo 879, § 1º, da CLT dispõe que, "Na liquidação, não se poderá modificar ou inovar, a sentença liquidanda, nem discutir matéria pertinente à causa principal".

In casu, constata-se, a partir do consignado no

acórdão recorrido, que "O exequente e o executado firmaram o acordo (Id d250987) nos autos, por meio do qual ficou ajustado que a empresa ré pagaria ao reclamante o valor de R$24.000,00, em 24 parcelas, por depósito nas datas fixadas no acordo. No caso de descumprimento, o executado pagaria multa de 50% sobre o saldo remanescente, assim como vencimento antecipado das parcelas vincendas. Verifica-se que a ré atrasou o pagamento de 23 das 24 parcelas acordadas.".

Não obstante isso, a Corte de origem concluiu que,

embora tenha ocorrido atraso no pagamento das parcelas, com períodos que variaram de 1 a 8 dias, o acordo foi quitado integralmente. Nessa linha, entendeu o Regional que não havia falar em aplicação da multa prevista no acordo. 

Dessa forma, a conclusão adotada não se coaduna com

o comando extraído da decisão transitada em julgado, a qual versou expressamente sobre a aplicação da multa de 50% em caso de descumprimento do acordo. 

Por conseguinte, o Regional, ao concluir indevida a

multa controvertida, violou a coisa julgada, haja vista que, conforme supramencionado, o título executivo judicial expressamente consignou a incidência da multa em caso de descumprimento do acordo, cabendo-se registrar que não se pode interpretar título judicial, mas apenas cumprir o respectivo comando.

Diante do exposto, conheço do recurso de revista por

ofensa ao art. 5º, XXXVI, da Constituição. 

 II – MÉRITO

Como consequência lógica do conhecimento do recurso

de revista por violação do art. 5°, XXXVI, da CF, dou-lhe provimento para reformar o acórdão regional e condenar os executados ao pagamento da multa de 50%, calculado sobre o valor das parcelas em atraso.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista, por ofensa ao art. 5º, XXXVI, da Constituição, e, no mérito, dar-lhe provimento, para reformar o acórdão regional e condenar os executados ao pagamento da multa de 50%, calculado sobre o valor das parcelas em atraso.

Brasília, 10 de junho de 2020.

 

 

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

DORA MARIA DA COSTA

Ministra Relator

A banalização da morte de trabalhadores

A banalização da morte de trabalhadores

Reflexões sobre o respeito à vida e o direito ao trabalho seguro

 

ANANDA TOSTES ISONI

Esse artigo foi publicado orinalmente no Jota, no dia 26/08/2015, e pode também ser consultado no seguinte endereço: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/a-banalizacao-da-morte-de-trabalhadores-26082020.

 

morte

Funcionário de um supermercado em Recife morre e seu corpo é coberto por guarda-sóis e isolado por caixas e tapumes improvisados. Foto: Renato Barbosa/WhatsApp

 

 

“Morreu na contramão, atrapalhando o tráfego.” Chico Buarque, Construção

 

A cena é aterradora: guarda-sóis, engradados de cerveja e caixas de leite em pó escondem do público o corpo de um trabalhador morto. Manoel Moisés Cavalcante atuava como promotor de vendas em um supermercado, quando sofreu um infarto que o levou a óbito. A loja não interrompeu as atividades. Consumidores continuaram a comprar, trabalhadores continuaram a cumprir ordens. Pouco depois, aqueles produtos que esconderam o corpo de Manoel estariam nas estantes.

A banalização da morte de trabalhadores não é novidade, mas a crueza de histórias como a de Manoel escancara fatos que preferimos não ver.  Tornou-se lugar-comum dizer que algum grau de miopia social é necessário para seguirmos vivendo. A realidade, afinal, pode ser insuportável.

Pouco a pouco nos dessensibilizamos ao sofrimento do outro e, de súbito, acordamos desse estado letárgico com um retrato que diz: o respeito pelo falecimento de um trabalhador vale menos do que o lucro com as vendas do dia. Desse duro despertar advêm indignação e notas de retratação, seguidas de esquecimento.

Foi a reação apática à morte de Manoel que fez lembrar o falecimento do modelo Tales Cotta Soares, horas depois de haver desmaiado na passarela da São Paulo

Fashion Week, em 2019. Nenhum desfile foi cancelado. Em ato de protesto, o rapper

Rico Dalasam subiu então ao palco para criticar a indiferença à morte de Tales “como se a vida não valesse nada”. Os espectadores reagiram com aplausos, mas permaneceram no evento.

A incoerência da reação da plateia na ocasião reflete uma sociedade que se in ama diante do desprezo à vida, mas não promove mudança. Ovacionado, Dalasam protestava: enquanto os ricos não lamentarem a morte das pessoas “a agonia vai estar no travesseiro de todo mundo”.

O desrespeito à vida da pessoa que trabalha, empregado ou não, assume contornos ainda mais graves quando a ação ou omissão do tomador de serviços concorre para seu adoecimento. Também nesse caso o valor da vida do trabalhador é relativizado em prol do “bom” funcionamento de empresas que o substituem tal qual uma peça de engrenagem. Não há tempo para o cuidado – não há tempo sequer para o luto – quando o mercado dita as regras.

Embora o direito a um ambiente de trabalho seguro tenha amparo na Convenção nº

155 da Organização Internacional do Trabalho, aprovada por meio do Decreto Legislativo nº 2/92, e nos artigos 7º, XXII, 200, VIII, e 225 da Constituição, não é incomum a inversão da lógica de que a prevenção de riscos deva se sobrepor à reparação de danos. Em uma economia orientada à maximização do lucro, as balizas são traçadas de forma a priorizar a redução de custos: vale o que pesar menos no bolso do patrão.

 

Se em circunstâncias ordinárias essa distorção preocupa, em um cenário de crise sanitária ela assume proporções alarmantes. Não se trata apenas de questionar a flexibilização prematura das medidas de isolamento social. É necessário também assegurar que a retomada oportuna das atividades presenciais ocorra de forma gradual, planejada e monitorada, em condições de trabalho seguras.

 

Nesse contexto, há que se preservar o direito de recusa ao trabalho presencial a pessoas pertencentes a grupos de risco, extensível a todos trabalhadores e trabalhadoras a quem se imponha o retorno a um ambiente de trabalho desprotegido. No ponto, preocupa o argumento de que, em tais situações, ao empregado caberia apenas requerer a rescisão do contrato de trabalho, por “correr perigo manifesto de mal considerável” (art. 483, “c”, da CLT). Resumir a complexidade da questão nesses termos significaria impor à pessoa trabalhadora a escolha atroz entre trabalho inseguro e desemprego.

Iniciativas pautadas na monetização do risco devem ser olhadas com cautela. Normas que obrigam o pagamento de adicional de insalubridade durante a pandemia, como a Lei Distrital nº 6.589/2020, não resolvem quando se trata de preservar o direito à vida. Ao revés. Em muitos casos, desestimulam o investimento em medidas protetivas, como o fornecimento e a reposição de equipamentos de proteção, cujo uso adequado demanda treinamento e fiscalização. É preciso ir além e priorizar uma política preventiva, que coíba a exposição de trabalhadoras e trabalhadores a riscos que possam ser evitados ou reduzidos.

Na defesa do direito à vida de quem trabalha, a tutela jurisdicional específica de que trata o artigo 497 do CPC assume papel central. Para não se reduzir a relevância da prestação jurisdicional à da tutela ressarcitória, em que o prejuízo à saúde já se concretizou, há que se ter clareza quanto à autonomia dos conceitos de ato ilícito e dano. Embora existam danos que resultem de atos ilícitos, pode haver ato ilícito sem dano e dano sem ato ilícito.

A ilicitude do ato advém de sua desconformidade com o direito. Se causar prejuízo, esse ato, além de ilícito, pode gerar o dever de reparação. Por outro lado, ainda quando não exista dano ou culpa, subsiste o direito de se inibir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito. Essa compreensão é fundamental a uma atuação orientada à prevenção, que privilegie a incolumidade física e mental de trabalhadores e trabalhadoras, e não a reparação de danos.

Não basta, contudo, o engajamento da comunidade jurídica. O comportamento do consumidor é decisivo quando se trata de comunicar ao mercado os valores sociais que devem norteá-lo. Negar-se a consumir produtos e serviços de empresas que negligenciem a saúde de quem trabalha é contribuir para a construção de um mundo em que nenhuma vida vale menos.

Enquanto especialistas ainda discutem se chegamos ao platô nas curvas que retratam a evolução da pandemia, torna-se evidente que o ponto de inflexão só virá quando medidas preventivas forem adotadas com seriedade. Sem o compromisso de cumprir e fazer cumprir medidas de saúde e segurança do trabalho, qualquer tentativa de retorno às atividades presenciais sempre será marcada por adoecimento e mortes. E não haverá guarda-sóis capazes de esconder essa dura realidade.

 

ANANDA TOSTES ISONI – Juíza do Trabalho no TRT da 15ª Região desde 2016 e atuou no Tribunal Superior do Trabalho de 2012 até o ingresso na magistratura.

 

 

Adicional de periculosidade reconhecido a promotor de vendas

A 3ª Turma do TST reconheceu o direito ao adicional de periculosidade promotor de vendas de uma fábrica de café, que fazia o uso da motocicleta para se deslocar entre os locais de divulgação do produto. No caso concreto, o trabalhador fazia uso da motocicleta por aproximadamente 10% da jornada diária, tendo a e. Turma compreendido que esse percentual é tempo suficiente para afastar o conceito de eventualidade e tempo extremamente reduzido (RR 11098-69.2017.5.03.0036).

O artigo 193 da CLT foi alterado em 2014, para, com a inclusão do parágrafo 4º, serem reconhecidas como atividades perigosas “as atividades de trabalhador em motocicleta”.

A partir dessa alteração legislativa surgiram debates acerca do alcance do dispositivo legal: o direito ao adicional seria devido apenas ao trabalhador motociclista, como o motoboy, o entregador, ou também àqueles que usam a motocicleta como meio de deslocamento durante a jornada de trabalho, como promotores de venda, vendedores externos, etc?

É relevante para a discussão a avaliação quanto ao fornecimento do meio de transporte pelo empregador e o conhecimento por parte dele quanto ao uso da motocicleta, bem como a aferição de qual a proporção da jornada é despendida dirigindo a motocicleta.

Aos poucos, vários julgados têm reconhecido o direito ao adicional de periculosidade para vendedores, promotores de venda, profissionais externos que usam com frequência a motocicleta para deslocamento entre os clientes, e consequentemente, mais sujeitos a risco de acidente.

Vale destacar que o uso da motocicleta apenas para ir e voltar do trabalho, no início e término da jornada - quando o trabalhador poderia receber vale-transporte, por exemplo -, ou seja, quando o uso da moto é escolha pessoal do trabalhador, não enseja o adicional, notadamente porque esse período de deslocamento a princípio não integra a jornada de trabalho.

Empregadores e trabalhadores, fiquem atentos!

Live - Boas Práticas em Audiências de Instruções Telepresenciais

Reserve na sua agenda: 4/9/2020, 15h.

A Amatra 10 e a AATDF vão debater um tema que mexe com os ânimos: as audiências de instrução telepresenciais.

Vamos ter um agradável, franco, objetivo, produtivo e experiente debate?

Considerando os expositores, a Juiza Elysângela Dickel e o advogado Fernando Russomano, e a moderação da Juiza Natália Queiroz Cabral Rodrigues, tem tudo para ser ótimo!

Esperamos vocês!

A transmissão será pelo canal da Amatra 10 no Youtube:

Dia Internacional da Igualdade Feminina - O dilema da escolha da mulher atleta: entre competir e parir

O dia 26/8 é o dia Mundial de reflexão e celebração em torno da tão desejada igualdade feminina.

Nesse dias, a Juíza do Trabalho Natalia Queiroz Cabral Rodrigues e o Juiz do Trabalho Marcos Ulhoa Dani, ambos do TRT-10ª Região, publicam artigo denominado “O Dilema da Escolha da Mulher Atleta: entre competir e parir. Questões Legais e Jurisprudenciais”.

No interessante artigo, os Magistrados fazem uma análise histórica do trabalhadora da mulher atleta, chegando à primeira metade do século XX no Brasil, onde havia proibição legal para a prática do esporte incompatível com a “natureza da mulher”, sendo vedado às mulheres a prática do futebol até 1979.

Abordam a dificuldade da mulher atleta profissional e a gestação e maternidade, principalmente em razão dos contratos por prazo determinado que existem no segmento desportivo.

O artigo passa por reflexões legais e sociológicas da condição da atleta gestante e mãe.

Vale a leitura! Segue o artigo: 

 

O dilema da escolha da mulher atleta: entre competir e parir. Questões legais e jurisprudenciais.

 

Natália Queiroz Cabral Rodrigues (Juíza do Trabalho do TRT da 10a Região. Mestre em Direito do Trabalho pela PUC-MG. Diretora da Escola Associativa da AMATRA 10)

Marcos Ulhoa Dani (Juiz do Trabalho do TRT da 10a Região. Especialista em Direito Material e Processual do Trabalho pela Faculdade Anhanguera-Uniderp. Membro da ANDD.)

 

1- Introdução 

O presente artigo pretende promover uma reflexão sobre a condição da atleta brasileira quando se depara com a gravidez e como a legislação protege (ou não protege) o nascituro de uma mulher que tenha como profissão o desenvolvimento de alguma modalidade esportiva.

O trabalho desportivo como ocupação profissional feminina é situação extremamente recente em terras brasileiras. A possibilidade e a abertura para o trabalho feminino no esporte tem sido lento e paulatino, em que pesem os inegáveis progressos neste campo, que só tomaram corpo a partir das últimas duas décadas do século passado.

Nos idos de 1940, na cidade do Rio de Janeiro, as jogadoras de futebol do time Primavera Atlético Clube faziam sucesso e alcançaram grande destaque no esporte, tendo jogado campeonatos inclusive em outros estados brasileiros.

No livro Evas do Gramado[1], o autor narra a trajetória do time, as dificuldades, os sucessos e a proibição da prática do esporte, que sobreveio em razão de um Decreto-Lei, editado pelo governo da época, cuja presidência era ocupada por Getúlio Vargas.

No que dizia respeito à prática de esportes pelas mulheres, disse o referido Decreto-Lei, tombado sob o número 3.199/1941:

“Às mulheres não se permitirá a prática de desportos incompatíveis com as condições de sua natureza, devendo, para este efeito, o Conselho Nacional de Desportos baixar as necessárias instruções às entidades desportivas do país”.

O percurso histórico, ainda que brevemente mencionado, é fundamental para a reflexão acerca das dificuldades sociais e, também, jurídicas encontradas pelas mulheres que desejavam praticar algum esporte, fosse por prazer ou como profissão.

Como definir um esporte “incompatível com a condição da natureza feminina”? A quem estava destinada tal norma proibitiva e ao mesmo tempo limitante? Aos homens, às famílias ou às mulheres?

A pesquisadora Giovana Capucim e Silva tentou desvendar este enigma e a partir de seus estudos publicou a obra Mulheres Impedidas: A proibição do futebol feminino na imprensa de São Paulo.

Segundo a autora:

“(...) mesmo com a proibição do esporte no País, as mulheres nunca pararam de jogar futebol. Seja na várzea ou em eventos de caridade, elas sempre desafiavam a tensão entre a “essência feminina” idealizada pela Era Vargas e a reafirmação da masculinidade presente nos jogos.”

Complementando, a historiadora ainda afirma que:

A resistência do Estado, muitas vezes, era o menor obstáculo que elas encontravam para poder jogar futebol (…) Os olhares e comentários repressores recebidos das famílias, amigos e companheiros(as) podiam pesar-lhes muito mais do que qualquer resolução de órgãos estatais”.

As mulheres ficaram por 40 anos (de 1941 até 1979) sem poder praticar formalmente o futebol, pois este foi considerado um esporte masculino, o que acarretou um atraso substancial no desenvolvimento do esporte no Brasil, o que não ocorreu com outras modalidades. Somente em 1983[2] o tema volta à baila no cenário legislativo brasileiro e a prática do esporte foi regulamentada para as mulheres. Como registra a autora Camila Pisani: “Essa proibição só deixou de existir (...) após muita luta, resistências e até inúmeros casos de polícia”[3].

Um ponto por demais importante diz respeito ao momento histórico no qual surge o decreto-lei que pendurou as chuteiras das meninas: o futebol como esporte tinha chegado há pouco no Brasil, com ênfase nas cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo e era considerado um hobby, uma diversão e não uma profissão.

A classe economicamente mais favorecida é que poderia dedicar-se a distrações deste tipo e esta sociedade dominante e masculina não desejava que suas mulheres se inserissem neste contexto, nem como torcedoras, quiçá como jogadoras.[4]

O decreto-lei mencionado sequer precisou determinar expressamente a proibição de que mulheres jogassem futebol ou que praticassem um determinado esporte, pois a redação do referido artigo 54 impedia a prática de desportos “incompatíveis com as condições” da natureza das mulheres. O estabelecimento de um conceito aberto prejudicou ainda mais as pretensões desportivas das mulheres, pois a interpretação era acerca de um conceito indeterminado.

A partir de então, a sociedade patriarcal encarregou-se de proibir, de evitar e de excluir a participação feminina no esporte.

A atleta brasileira, como se vê, desde sempre percorreu caminhos tortuosos se pretendesse seguir a carreira profissional e viver a partir do esporte, pois facilmente pode-se concluir que a sociedade da época pretendia deixar a mulher fora do espaço esportivo profissional. Tal sentimento levou à ausência de proteção jurídica adequada e à falta de contemporaneidade dos normativos protetivos existentes, demandando atualização legislativa, contratual e social para a adequada formação de novos parâmetros, inclusive na seara interpretativa.

A reflexão torna-se mais profunda quando a condição de profissional do esporte inclui a condição de mãe.

2 – Dificuldades no mercado de trabalho para a mulher atleta. A difícil escolha entre parir e competir. Questões legais, jurisprudenciais e contratuais.

Como consequência das dificuldades históricas da inserção feminina no mundo desportivo, a profissionalização das mulheres segue extremamente atrasada. Conforme relatório e pesquisa realizados pela FIFPRO, que é uma associação internacional de atletas de futebol, o maior desejo das jogadoras de futebol é a profissionalização. Segundo o relatório, em grande parte das nações praticantes do desporto, às mulheres ainda é negada a profissionalização, classificando suas disputas somente como competições amadoras. Segundo a pesquisa mencionada, que ouviu atletas de 186 seleções nacionais femininas de futebol, a maior preocupação das jogadoras é a profissionalização do esporte, pois, assim, haveria a possibilidade de recebimento de salários, proteção da seguridade social e um ganho maior que não tem nada a ver com valores pecuniários: respeito[5].

Em alguns países, a condição de profissionais é um requisito, inclusive, para o estabelecimento de sindicatos profissionais. No Brasil, o estabelecimento de um vínculo de emprego é condição indispensável para acesso a proteções sociais básicas, seja em âmbito trabalhista, seja em âmbito previdenciário. Ou seja, como se vê, antes de qualquer pleito de direitos fundamentais de segunda dimensão, as mulheres ainda batalham pelo direito de existirem profissionalmente no desporto.

A existência de normas constitucionais e infraconstitucionais não possui o condão de atribuir as mulheres o exercício pleno de seus direitos, inclusive no que diz respeito à maternidade. A realidade é mais complexa do que previsões legais. A maternidade, muitas vezes, se torna um obstáculo para a carreira desportiva profissional de uma mulher atleta, por preconceito de mercado, ausência de proteção social ou coletiva. Um exemplo muito claro disso ocorreu com a desportista americana de atletismo, Allyson Felix. Allyson é a única mulher a conquistar nada menos que seis medalhas de ouro olímpicas. Ela ainda ostenta 12 títulos mundiais em sua categoria.

Mesmo assim, no momento no qual decidiu ser mãe, houve, por parte de sua maior patrocinadora, uma gigante da indústria de material esportivo, tentativa de redução dos valores que lhe eram pagos a título de patrocínio, da ordem de 70%, após ter dado a luz. Algumas outras atletas, na mesma situação, resolveram romper seus contratos de patrocínio com a mesma empresa, para expor a situação perante a imprensa. A multinacional, após a exposição, resolveu rever suas políticas em relação à maternidade das atletas por ela patrocinadas[6].

Após batalha com a sua patrocinadora, a atleta e mãe Allyson venceu resistências e conseguiu que a empresa mudasse a sua política e não mais imprimisse cláusulas de redução de ganhos por perda de performance se as suas atletas ficassem grávidas, por um período de 18 meses, sendo oito desses meses antes do parto[7].

O mais importante a se pensar diz respeito ao afastamento do atleta por motivos de saúde, que em muitos casos pode determinar o afastamento de treinos e competições por um ano ou mais. Traçando-se um paralelo: se o motivo do afastamento ou mesmo diminuição do rendimento for a maternidade ou a maternagem, as mulheres, o nascituro e sua família não deveriam sofrer discriminação, se na doença não sofrem. Deveria ser oferecida a proteção.

A Consolidação das Leis do Trabalho possui capítulo próprio (III) sobre o trabalho da mulher, cujo título é “Da proteção do Trabalho da Mulher”, compreendendo os artigos 372 a 401. Especificamente no artigo 391 declara-se não ser justo motivo para a rescisão contratual o simples estado gravídico da trabalhadora, assim como o fato de ter contraído matrimônio. Já no artigo 391-A estipula-se a estabilidade provisória à trabalhadora gestante, ainda que a gravidez ocorra durante o aviso prévio, indenizado ou trabalhado.

O C. Tribunal Superior do Trabalho, ao editar a Súmula 244, assim preconizou o entendimento daquela corte, nos idos de 2012:

“Súmula nº 244 do TST - GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA (redação do item III alterada na sessão do Tribunal Pleno realizada em 14.09.2012) - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012

I - O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade (art. 10, II, "b" do ADCT).

 II - A garantia de emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade.

III - A empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art. 10, inciso II, alínea “b”, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado”.

O item III do verbete sumular deixava claro que até mesmo nos contratos por prazo determinado o estado gravídico prevalecia ante a data certa para o término do contrato e promoveria a prorrogação do prazo final.

Tal entendimento estaria compatível com o item I da referida súmula, pois uma vez concedido o aviso prévio, o contrato que anteriormente não tinha termo final, passa a ter e, mesmo assim, a estabilidade conferida a trabalhadora gestante permaneceria.

Em decisão proferida em 19/05/2020, pela Sétima Turma do C.TST, e veiculada na página do tribunal na internet, a Corte reconheceu o direito à estabilidade provisória a uma trabalhadora que engravidou no bojo de um contrato de experiência, sob o argumento de que a estabilidade provisória se destinava também ao nascituro, e não só à mãe. Nestes casos de contrato de experiência, haveria a justa expectativa de contratação após o término do ajuste, caracterizando-se como arbitrária a dispensa após o fim do período, para fins de estabilidade em virtude da gestação.

Todavia, é importante destacar que o referido entendimento não é o mesmo em relação a outros contratos por prazo determinado. No que pertine a outros contratos de prazo determinado, o posicionamento do Pleno do C. TST foi externado no IAC (Incidente de Assunção de Competência) 5639-31.2013.5.12.0051, decidido pelo Tribunal Pleno do TST, que tem observância obrigatória e vinculante, nos termos do art. 947, §3o, do CPC. No referido julgado, cujo acórdão foi publicado na data recente de 29/07/20, entendeu-se que a empregada contratada a título de experiência tinha a legítima expectativa de ser efetivada em um contrato de prazo indeterminado, tal como decidido pela 7a turma do TST, mas tal fato não ocorria com a trabalhadora temporária, contratada sob a égide da lei 6.019/74, em um contrato de prazo determinado. A empregada contratada sob este regime já teria ciência da transitoriedade do vínculo de emprego, não se podendo falar, ao fim e ao cabo, em dispensa arbitrária ao final do ajuste. Neste sentido, o TST fixou a seguinte tese vinculante:

"É inaplicável ao regime de trabalho temporário, disciplinado pela Lei n.º 6.019/74, a garantia de estabilidade provisória à empregada gestante, prevista no art. 10, II, b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias"

Seguindo tal entendimento, a 4a turma do TST, posicionou-se no seguinte sentido, decretando o chamado overruling (superação de tese firmada) acerca do disposto no item III, da Súmula 244 do TST:

“[...] 1. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO. GRAVIDEZ NO CURSO DO CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO. SÚMULA Nº 244, III, DO TST. TEMA 497 DA REPERCUSSÃO GERAL DO STF. EFEITO VINCULANTE E EFICÁCIA ERGA OMNES. APLICAÇÃO OBRIGATÓRIA DA TESE ATÉ A ESTABILIZAÇÃO DA COISA JULGADA (TEMA 360 DA REPERCUSSÃO GERAL). I) Segundo o entendimento consagrado no item III da Súmula n° 244 do TST, “a empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art. 10, inciso II, alínea "b", do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado”. Sobre o tema, a jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que a circunstância de ter sido a empregada admitida mediante contrato de aprendizagem, por prazo determinado, não constitui impedimento para que se reconheça a estabilidade provisória de que trata o art. 10, II, “b”, do ADCT. II) A discussão quanto ao direito à estabilidade provisória à gestante contratada por prazo determinado, na modalidade de contrato de aprendizagem, encontra-se superada em virtude da tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE 629.053/SP, em 10/10/2018, com a seguinte redação: A incidência da estabilidade prevista no art. 10, inc. II, do ADCT, somente exige a anterioridade da gravidez à dispensa sem justa causa. III) A decisão do Supremo Tribunal Federal no Tema 497 é de clareza ofuscante quanto elege como pressupostos da estabilidade da gestante (1) a anterioridade do fator biológico da gravidez à terminação do contrato e (2) dispensa sem justa causa, ou seja, afastando a estabilidade das outras formas de terminação do contrato de trabalho. Resta evidente que o STF optou por proteger a empregada grávida contra a dispensa sem justa causa – como ato de vontade do empregador de rescindir o contrato sem imputação de justa causa à empregada -, excluindo outras formas de terminação do contrato, como pedido de demissão, a dispensa por justa causa, a terminação do contrato por prazo determinado, entre outras. IV) O conceito de estabilidade, tão festejado nos fundamentos do julgamento do Tema 497 da repercussão geral, diz respeito à impossibilidade de terminação do contrato de trabalho por ato imotivado do empregador, não afastando que o contrato termine por outras causas, nas quais há manifestação de vontade do empregado, como no caso do pedido de demissão (a manifestação de vontade se dá no fim do contrato) ou nos contratos por prazo determinado e no contrato de trabalho temporário (a manifestação de vontade do empregado já ocorreu no início do contrato). Assim, na hipótese de admissão mediante contrato por prazo determinado, não há direito à garantia provisória de emprego prevista no art. 10, inciso II, alínea “b”, do ADCT. Superação do item III da Súmula 244 do TST pelo advento da tese do Tema 497 da repercussão geral do Supremo Tribunal Federal, em julgamento realizado no RE 629.053, na Sessão Plenária de 10/10/2018. V) A tese fixada pelo Plenário do STF, em sistemática de repercussão geral, deve ser aplicada pelos demais órgãos do Poder Judiciário até a estabilização da coisa julgada, sob pena de formação de coisa julgada inconstitucional (vício qualificado de inconstitucionalidade), passível de ter sua exigibilidade contestada na fase de execução (CPC, art. 525, § 1º, III), conforme Tema 360 da repercussão geral. VI) Recurso de revista de que não se conhece.” (TST-RR-1001175-75.2016.5.02.0032, 4ª Turma, rel. Min. Alexandre Luiz Ramos, julgado em 4/8/2020.)  - grifamos

O entendimento do julgado acima transcrito, em seus termos, seria no sentido de que a Súmula 244, item III, do TST, estaria em choque com a tese fixada pelo STF no Tema 497 de repercussão geral. Entendeu-se, conforme julgamento retro, que a terminação de um contrato de prazo determinado pelo atingimento de seu termo final não se daria por ato volitivo do empregador, mas sim por ajuste do seu termo final pela vontade de ambas as partes (empregada e empregador).

Nesta compreensão, a turma do TST entendeu que não haveria dispensa arbitrária ou sem justa causa, mas sim terminação do contrato pelo advento do seu termo final, o que não geraria a proteção do art. 10, II, “b”, do ADCT. Ou seja, entendeu-se que, no contrato de prazo determinado, só haveria a estabilidade contratual se a dispensa ocorresse por vontade do empregador, sem justa causa, antes do termo final do contrato de trabalho por prazo determinado.

Como se vê, atualmente, há uma tendência jurisprudencial pela inaplicabilidade da estabilidade da gestante em contratos de prazo determinado, com a exceção do contrato de experiência, no qual há uma legítima expectativa de continuidade do contrato, quando do seu termo.

A lei que cuida dos contratos do atleta profissional (Lei 9.615-98, popularmente conhecida como Lei Pelé) enumera no artigo 28, §4º alguns dos direitos destinados ao atleta profissional, indicando as normas gerais trabalhistas e da seguridade social como regras subsidiárias, ressalvadas as peculiaridades da norma específica, mas citando, por exemplo, férias de 30 dias, repouso semanal remunerado e jornada de 44 horas semanais.

Não há menção específica a atleta do sexo feminino ou a direito conferido a atleta gestante, presumindo-se, portanto, que as normas previstas na CLT e nas Leis 8.213/91 e 8.212/91 sejam plenamente aplicáveis aos contratos firmados com as atletas femininas. Por critério hierárquico de solução de antinomias aparentes, a lei especial também se submete às regras constitucionais, em especial nos artigos 6º, 7º e 8º da CRFB/88.

Os contratos firmados com os atletas, como regra, sejam homens ou mulheres, são por prazo determinado, sendo comum em algumas modalidades que a transferência de local da prestação de serviços e do tomador de serviços se altere com frequência. Uma outra particularidade muito comum nos contratos de atletas profissionais é o contrato paralelo de cessão de direitos de imagem, para exploração da imagem da (o) atleta e que, de acordo com a previsão do art. 87-A, da Lei 9.615/98, detém natureza civil. Segundo o parágrafo único do mesmo dispositivo legal, o valor do contrato de imagem não poderá ultrapassar 40% da remuneração total paga à (ao) atleta.

Neste particular, cabe lembrar que a Previdência Social detém como base de cálculo do benefício previdenciário do salário-maternidade somente o salário de contribuição. De acordo com o art. 73, III, da lei 8.213/91, o benefício do salário-maternidade será de 01/12 da soma dos últimos 12 salários de contribuição da empregada atleta, sendo que o art. 28, I, da lei 8.212/91 deixa claro que o salário de contribuição somente é formado pelos valores recebidos a título de retribuição ao trabalho, o que leva à pacífica interpretação de que os montantes que compõem o cálculo do salário de contribuição são somente aqueles valores recebidos a título retributivo salarial.

Em outras palavras, não fará parte da base de cálculo do salário de contribuição, para futuro cálculo do benefício do salário-maternidade, eventuais recebimentos de índole civil, tais como os montantes auferidos pelas atletas a título de cessão de direito de imagem e eventual repasse do chamado direito de arena, parcela também reconhecida pela lei como de natureza cível.

Diante desta realidade, o que acontece com a mulher, atleta, que após ter firmado um contrato de trabalho com base na Lei 9.615/98, descobre-se grávida? E quais medidas de contorno se podem tomar para garantir um mínimo de estabilidade contratual e garantia de rendimentos integrais durante um eventual período de gravidez, consideradas as peculiaridades legais do contrato especial de trabalho desportivo?

É pertinente a reflexão, pois programar uma gravidez, para a profissional atleta, seria o mesmo que interromper a carreira no momento de possível maior performance desportiva e de maiores ganhos, frisando que, a rigor, o ápice desportivo da atleta profissional coincide com o momento biológico mais adequado à concepção. A possibilidade de congelamento de óvulos para uma gestação posterior parece, atualmente, ser financeiramente inviável, em um cenário em que as atletas ainda lutam por salários e profissionalização. Observa-se, ainda, que, geralmente, a carreira dos desportistas de alto rendimento é extremamente curta. Neste sentido, manifestou-se a jogadora americana Phoebe Right:

“Em entrevista ao jornal "The New York Times", a atleta Phoebe Wright, que foi patrocinada pela Nike de 2010 a 2016, resumiu o pensamento de algumas atletas que pensam em engravidar. "Ficar grávida é o beijo da morte para uma atleta mulher. Se eu engravidasse, não contaria para a Nike de jeito nenhum", disse.[8]

 

Diante deste cenário, a reflexão faz-se necessária.

A gravidez é um fato que não se esconde por muitos meses e requer cuidados, ainda que a mulher possa atuar profissionalmente sem qualquer problema; mas, ao se pensar numa atleta, a depender da modalidade, a atuação profissional estará comprometida e dentro de pouco tempo, interrompida.

O desempenho de uma atleta grávida não será o mesmo e, além disso, há o risco de causar prejuízo a saúde da mãe ou do bebê, motivo pelo qual a mulher terá que se afastar do trabalho, em licença, muito antes do que outra profissional que não necessite de desempenho físico para trabalhar.

E este é um primeiro ponto assertivo: a mulher ocupa a posição de atleta profissional e, assim, tem sua fonte de subsistência e realização no esporte, que pode (e deve) ser a atividade profissional, se assim for por ela escolhida, tal como acontece com muitos atletas do sexo masculino.

Sendo o esporte a atividade profissional escolhida pela mulher, ela tem o direito de procriar e cuidar de sua prole, com a preservação do seu emprego e a manutenção de seus rendimentos, para proporcionar uma existência digna ao nascituro e, assim que possível, retornar aos treinos e as competições.

Numa situação de normalidade, a gravidez afastará a mulher dos campos, das quadras, das piscinas, das competições, em média por um ano, o que aparentemente pode ser muito, mas em várias situações um afastamento de igual período ocorre para tratamento de lesões e os atletas retornam normalmente às suas atividades.

Quando o homem é o atleta profissional, normalmente o que assistimos são as esposas e os filhos, ainda pequenos, nas arquibancadas, torcendo, sem que haja necessidade de interrupção da carreira em prol da paternidade.

Pergunta-se, então: por que não retornar após o parto?

A difícil escolha entre parir e competir deve restringir-se a questões profissionais, deve ser uma escolha da mulher atleta, que pode se programar, para decidir qual o momento mais adequado para afastar-se dos treinos e cuidar do filho, porém, não poderá ser uma escolha eivada de vício de vontade, em razão de questões financeiras.

A escolha jamais poderá levar em consideração a diminuição dos valores pagos, porque a profissional estará fora das partidas, das competições, durante parte da gestação e no pós-parto, a depender da orientação médica. Fora isto, é preciso ser garantido o direito não só à maternidade, mas, também, à maternagem, com possibilidade, por exemplo, de pausas para a amamentação da criança, nos termos do art. 396 da CLT. Não estamos tratando de situação imprevisível ou inadiável que gerasse, por exemplo, nos contratos de cessão de imagem, uma aplicação de “Teoria da Imprevisão” ou revisão do contrato por onerosidade excessiva.

A maternidade, em sendo a opção da mulher, é um processo fisiológico natural na vida humana, capaz de gerar a sensação de pertencimento familiar e, ao fim e ao cabo, propiciar a perpetuação da espécie e da família, que detém especial proteção do Estado, nos termos do art. 226 da CRFB-88.

Os rendimentos na maternidade devem ser preservados, mesmo em se tratando de contrato de prazo determinado, seja no que toca à remuneração composta por salário-base, direitos de imagem ou outras gratificações pagas por patrocinadores, uma vez que a mulher tem o direito de ser mãe e este fato não pode ser motivo para minorar sua condição de profissional, especialmente em relação àquelas parcelas de recebimento incondicionado. O que deve ser verificado é quem será responsável pela manutenção dos ganhos pecuniários da atleta, durante o seu período de afastamento.

Um primeiro ponto primordial, como visto, é a necessária profissionalização da condição da mulher atleta, como condição básica da gestão de sua carreira. Ou seja, a atleta deve ser segurada da Previdência Social, pelo estabelecimento de um vínculo de emprego desportivo. Uma vez reconhecida tal relação empregatícia, à mulher será garantido o salário-maternidade pela Previdência Social, mesmo se o contrato de trabalho desportivo cesse pelo seu termo final, como parece ser a tendência do posicionamento jurisprudencial do TST na matéria, como visto acima. É o chamado “período de graça” da Previdência Social, previsto, neste caso, no art. 15, incisos I e II, da Lei 8.213/91. O valor do salário-maternidade para a segurada empregada será igual à sua remuneração anterior ao afastamento, no caso de salário fixo, nos termos do art. 206 da IN 77/2015, instrução esta que remete ao limite máximo o valor do teto fixado no art. 37, XI, da CRFB-88, em cominação com o art. 248 da mesma Carta Magna. Neste ponto é importante lembrar que o salário-maternidade não está sujeito à limitação do teto de benefícios geral da Previdência Social, posicionamento este consagrado há cerca de duas décadas pelo STF, no julgamento da ADI 1946-5/DF, de relatoria do Exmo. Ministro Sidney Sanches. Na oportunidade, destacam-se trechos da ementa daquele julgamento histórico:

“EMENTA: - DIREITO CONSTITUCIONAL, PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. LICENÇA-GESTANTE. SALÁRIO. LIMITAÇÃO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 14 DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20, DE 15.12.1998. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO DISPOSTO NOS ARTIGOS 3º, IV, 5º, I, 7º, XVIII, E 60, § 4º, IV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. O legislador brasileiro, a partir de 1932 e mais claramente desde 1974, vem tratando o problema da proteção à gestante, cada vez menos como um encargo trabalhista (do empregador) e cada vez mais como de natureza previdenciária. Essa orientação foi mantida mesmo após a Constituição de 05/10/1988, cujo art. 6° determina: a proteção à maternidade deve ser realizada "na forma desta Constituição", ou seja, nos termos previstos em seu art. 7°, XVIII: "licença à gestante, sem prejuízo do empregado e do salário, com a duração de cento e vinte dias". 2. Diante desse quadro histórico, não é de se presumir que o legislador constituinte derivado, na Emenda 20/98, mais precisamente em seu art. 14, haja pretendido a revogação, ainda que implícita, do art. 7º, XVIII, da Constituição Federal originária.” - grifamos.

Ou seja, percebe-se, por aquele julgamento plenário da Corte Máxima da Nação, que a obrigação de manutenção de patamares salariais durante a licença maternidade é obrigação do Estado, eis que o salário-maternidade reveste-se muito mais como um encargo previdenciário do que trabalhista propriamente dito. Assim, é cabível a interpretação, analisando o ponto de vista da relação de trabalho e a interpretação jurisprudencial prevalente e atual do TST, que, ausentes previsões contratuais ou coletivas mais benéficas, caberia à UNIÃO garantir não só os salários fixos da atleta grávida durante o seu afastamento gestacional e pós-parto, bem como a UNIÃO seria responsável pelo pagamento de salários à atleta durante o período de estabilidade remanescente após o parto, mesmo que o contrato de trabalho desportivo tenha sido extinto pelo seu termo final de contrato de prazo determinado que é.

Este entendimento, de certa forma, foi corroborado pelo E. STF, no julgamento do Tema 72 de Repercussão Geral (RE 576.967, julgado em 04/08/20), no qual se declarou a inconstitucionalidade de dispositivos da Lei Orgânica da Seguridade Social (Lei 8.212/1991) que instituíam a cobrança da contribuição previdenciária patronal sobre o salário-maternidade. Segundo informações colhidas no painel de notícias do sítio eletrônico do STF:

“No voto condutor da decisão, o relator do RE, ministro Luís Roberto Barroso, destacou que a Constituição Federal e a Lei 8.212/1991 preveem como base de cálculo da contribuição previdenciária os valores pagos como contraprestação a trabalho ou serviço prestado ao empregador, empresa e entidade equiparada. No caso da licença-maternidade, no entanto, a trabalhadora se afasta de suas atividades e deixa de prestar serviços e de receber salários do empregador. Portanto, o benefício não compõe a base de cálculo da contribuição social sobre a folha salarial. “O simples fato de que a mulher continua a constar formalmente na folha de salários decorre da manutenção do vínculo trabalhista e não impõe natureza salarial ao benefício por ela recebido”, ressaltou. O relator salienta que a regra questionada (artigo 28, parágrafo 2º, da Lei 8.212/1991) cria, por lei ordinária, nova fonte de custeio da seguridade social diversa das previstas na Constituição Federal (artigo 195, inciso I, alínea ‘a’). De acordo com a norma constitucional, a criação de outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou a expansão da seguridade social exige a edição de lei complementar.

Discriminação da mulher no mercado de trabalho

Barroso destacou diversas pesquisas que demonstram a reiterada discriminação das mulheres no mercado de trabalho, com restrições ao acesso a determinados postos de trabalho, salários e oportunidades. Um estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT) citado por ele concluiu que, no Brasil, os custos adicionais para o empregador correspondem a 1,2% da remuneração bruta mensal da mulher. Para o relator, admitir uma incidência tributária que recaia somente sobre a contratação de mulheres e mães é tornar sua condição biológica, por si só, um fator de desequiparação de tratamento em relação aos homens, desestimulando a maternidade ou, ao menos, incutindo culpa, questionamentos, reflexões e medos em grande parcela da população, pelo simples fato de ter nascido mulher. “Impõe-se gravame terrível sobre o gênero feminino, discriminado na contratação, bem como sobre a própria maternidade, o que fere os direitos das mulheres, dimensão inequívoca dos direitos humanos”, afirmou.” [9]

Como bem afirmado pelo Exmo. Ministro Luís Roberto Barroso, a inclusão de gastos adicionais ao empregador pela contratação de mulheres e mães seria tornar a condição biológica feminina, por si só, um fator de desequiparação no tratamento das mulheres em relação aos homens, desestimulando a maternidade “ou, ao menos, incutindo culpa, questionamentos, reflexões e medos em grande parcela da população, pelo simples fato de ter nascido mulher”. Ou seja, não pode tal ônus ser transferido às mulheres atletas e também não pode tal ônus ser transferido para os empregadores desportivos, sob pena de se criar mais um entrave à evolução do desporto feminino, já tão eivado de obstáculos e resistências, como se viu por seu próprio contexto histórico. Neste sentido declarou o executivo do clube Orlando Pride dos Estados Unidos, Sydney Leroux Dwyer, em conta do Twitter (fevereiro de 2020), conforme tradução livre:

“Com grande frequência, observamos que as mulheres têm que decidir entre a maternidade e sua carreira. Seria triste desperdiçar nossa riqueza de talento pelo sentimento que não se pode fazer ambas as coisas”. 

A solução já existe no texto constitucional, sendo confirmada pela interpretação dos julgamentos do STF. O benefício do salário-maternidade é uma garantia previdenciária, e não trabalhista. Como garantia previdenciária, o Estado deve custear os salários fixos das atletas profissionais durante o período de afastamento das jogadoras na maternidade e durante o período estabilitário, previsto no art. 10, II, “b”, do ADCT, nesta última situação caso o contrato desportivo de prazo determinado já tenha sido encerrado pelo atingimento do seu termo final, como consectário lógico do período de graça.

No que tange aos rendimentos recebidos por cessão de direito de imagem, patrocínios e repasses de direito de arena, por serem parcelas indenizatórias cíveis, há questões específicas a serem consideradas. No que pertine à cessão de direito de imagem e patrocínios, tratam-se de contratos paralelos ao contrato especial de trabalho desportivo, sem influência, portanto, no pagamento de salário-maternidade pelo INSS e, assim, sem incidência na base de cálculo para o pagamento do benefício.

Neste caso, os contratos de patrocínio e de cessão de direito de imagem assinados devem ser respeitados, como atos jurídicos perfeitos (art. 5o, XXXVI) sem que seja permitido o estabelecimento de cláusulas de diminuição de valores da cessão de direito de imagem ou patrocínios por perda de performance durante o período de gravidez ou de licença maternidade da atleta, uma vez que se trataria de previsão discriminatória (art. 1o, da lei 9.029/95) e com onerosidade injustificada a somente uma das partes, o que viola o princípio da boa-fé objetiva que deve permear todos os ajustes contratuais (arts. 113 e 422 do CC).

A discriminação, segundo a doutrina tradicional, é a recusa de um direito por motivo injustificadamente desqualificante. Assim, seria discriminatória a previsão de diminuição ou cessação de repasses de valores de direito de imagem ou patrocínios pelo simples fato da atleta estar gestante ou em gozo de licença maternidade, ou por diminuição de performance durante a maternidade, mesmo porque a imagem da atleta poderá continuar a ser explorada nesse interregno. Entendimento em contrário significaria discriminação pelo simples fato da atleta ostentar a condição biológica de mulher, o que é vedado, inclusive, pelo disposto no art. 3o, IV, da CRFB-88, que preconiza como um dos objetivos fundamentais da República a promoção do bem comum, sem preconceitos, entre outros, de sexo ou quaisquer outras formas de discriminação. No que tange às cláusulas abusivas nos contratos, situação que se configuraria no caso presente caso fossem implementadas cláusulas com aqueles conteúdos aventados, segue o magistério de César Fiúza:

“Essas cláusulas revelam, na verdade, condutas abusivas, seja por serem estritamente ilícitas, seja por revelarem abuso de direito, isto é, seja por serem funcionalmente ilícitas. É evidente que, levando em consideração os princípios informadores do Direito Contratual e os valores consagrados na Constituição, pode afirmar-se que estas cláusulas são abusivas não só nas relações de consumo, mas em qualquer relação contratual, pelo menos em tese.[10]

 

O eminente civilista, lastreando-se no Código de Defesa do Consumidor, que poderia ser utilizado no caso em concreto, pois a atleta somente é detentora de sua imagem a ser cedida, enquanto o clube e os patrocinadores têm o poderio econômico, caracterizando-se a ausência de equidade no estabelecimento de cláusulas daquele jaez, listou hipóteses de cláusulas abusivas, que, em nossa visão, se adéquam ao caso em análise:

“(…) seriam abusivas, dentre outras, as cláusulas que: (…) impliquem em renúncia ou disposição de direitos. (…)Estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade. (…) O contrato é abusivo na origem. O fundamento é a justiça contratual, e a regra se aplica também ao Direito Comum. O Código de Defesa do Consumidor estabelece alguns parâmetros para identificar o que seria vantagem ou desvantagem exagerada. Estes mesmos parâmetros se aplicam a qualquer contrato, mutatis mutandis. Assim, presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que: a) ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence; b) restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar o seu objeto ou o equilíbrio contratual; c) mostra-se excessivamente onerosa para o consumidor (devedor), considerando-se a natureza e o conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso. (…) Trata-se aqui de condição ou cláusula puramente potestativa e, portanto, leonina. Só uma das partes suporta os ônus. Só uma das partes usufrui vantagens. Nos contratos bilaterais, os ônus e vantagens devem ser compartilhados.[11]” - grifamos

Quanto ao repasse de direitos de arena, não se vê a possibilidade de pagamento de tais valores caso a atleta gestante não participe, de fato, do espetáculo, pois o art. 42 e parágrafos da Lei Pelé é claro ao estabelecer que o repasse do direito de arena (que é um direito, originalmente, dos clubes) aos (às) atletas se restringem àqueles (as) atletas que participaram do evento esportivo que foi transmitido, como titulares ou suplentes.

Não se pode também desprezar que, inobstante essas interpretações legais e jurisprudenciais, há, claro, que se valorizar as boas iniciativas de algumas agremiações desportivas que, adiantando-se a qualquer celeuma judicial, já instituem boas práticas em sua relação de trabalho com as atletas, tal como ocorreu com a atleta Roberta Rosa, empregada do Grêmio de Futebol Porto-Alegrense. Constou da reportagem na rede social do Instagram @dibradoras:

“Essa é uma preocupação comum às mulheres no esporte, já que o corpo delas é instrumento de trabalho e, muitas vezes, uma gravidez significa o fim da carreira, já que elas perdem o emprego nos clubes e ficam sem qualquer estrutura para manter treinamentos e retornar após o nascimento do bebê. A lateral da seleção brasileira, @tata_dias10 , é um grande exemplo dessa dificuldade - ela parou de jogar duas vezes e quase desistiu do futebol por causa da gravidez.
Mas Beta encontrou respaldo no Grêmio, que demonstrou apoio à atleta e incentivo para que ela mantenha os treinos monitorados. “Já tiveram meninas que foram dispensadas, abandonadas por seus clubes. O lado bom da profissionalização é que eu tenho a lei do meu lado, mas sentia medo de contar que estava grávida no meio dessa parada. Ainda bem que o clube foi super tranquilo, me deixou segura. Fiquei muito aliviada por não ser deixada de lado”, disse em entrevista à 
@rmedeirosrenata na @gauchazh. Completando sete meses de gravidez, a zagueira já tem nome para seu menino: Theo Roberto. E ele já tem o uniforme do time do coração! Que cada vez mais a gente possa ver a gravidez como algo natural na vida das atletas. E que elas possam ter liberdade para escolher ter ou não filhos durante ou após a carreira sem serem prejudicadas por isso.” [12]

Todavia, percebe-se que não se pode contar apenas com a boa vontade de alguns clubes para que as atletas sejam profissionalizadas que, como se vê, é condição básica para que a atleta tenha proteção previdenciária, uma melhor gestão de sua carreira e possa planejar, com tranquilidade, o momento da maternidade. Esta exigência de profissionalização já é demandada pela CBF desde 2018 e anos seguintes para os clubes da série A; desde 2019 e anos seguintes para os clubes da série B; desde 2020 para os clubes da série C e anos seguintes; e será exigida para os clubes da série D de 2021 em diante, como condição de licenciamento dos clubes para as competições organizadas pela CBF.

No caso, cada agremiação requerente deverá contar com uma equipe principal feminina ou manter acordo de parceria ou associação com um clube que mantenha uma equipe feminina principal estruturada, da melhor forma que puder desenvolver o esporte e também deve ter ao menos 1 (uma) equipe de categoria de base feminina (Sub-20, Sub-17 ou Sub-15) ou manterá acordo de parceria ou associação com um clube que tenha referida equipe estruturada[13]. Isto está previsto no Regulamento de Licença de Clubes da CBF e constituem condições mandatórias para que os clubes possam obter a licença para participar e competir em competições organizadas pela CBF e pela CONMEBOL, esta última em âmbito continental, seja com suas equipes femininas ou masculinas. Ou seja, também cabe à entidade de organização máxima do futebol nacional fiscalizar (art. 3o, IV, do Regulamento de Licença de Clubes da CBF) se suas diretrizes estão sendo cumpridas e punir (art. 3o, VI, do Regulamento de Licença de Clubes da CBF), esportivamente, aqueles clubes que não a obedecem, inclusive com a restrição de licenciamento para participação nas competições. Outros clubes podem até denunciar eventual ausência de cumprimento de tais obrigações por clubes rivais, o que pode gerar os apenamentos cabíveis, inclusive perante a Justiça Desportiva. Tais apenamentos são possíveis, na medida em que as regras desportivas ajustadas pelas entidades de administração do desporto são fontes legítimas do direito, como usos e costumes desportivos[14], nos termos, inclusive, dos arts. 1o,§ 1o, 16 e 50 da Lei Pelé, cuja autonomia decorre do preconizado pelo art. 217, I, da CRFB-88. As punições, segundo o artigo 48 e incisos da Lei Pelé, podem ir desde advertência e censura escrita até multa, suspensão e desfiliação ou desvinculação, sendo que estas três últimas punições poderão ser aplicadas após decisão definitiva da Justiça Desportiva. Sabe-se, pela visão dos torcedores, que a punição desportiva, mais do que a punição pecuniária, é a mais persuasiva no mundo do desporto, sendo de todo indicada a intervenção das entidades de administração do desporto e da Justiça Desportiva para que seja assegurado o cumprimento dos próprios regulamentos desportivos pertinentes.

Ademais, não se pode esquecer os importantes papéis da Auditoria Fiscal do Trabalho e do Ministério Público do Trabalho em identificar descumprimentos por parte dos clubes em reconhecer o vínculo de emprego com as atletas, quando houver a formação de equipes nos moldes previstos pela CBF, ficando clara a caracterização dos vínculos de emprego desportivos das atletas com os clubes, nos termos, inclusive dos arts. 2o e 3o da CLT. Nestas situações, poderá haver a lavratura de autos de infração (arts. 41 e 47 da CLT, sem necessidade de dupla visita, nos termos do art. 47, §2o, da CLT), instauração de inquéritos cíveis, elaboração de termos de ajustamento de conduta, e, em última instância, a provocação do Judiciário Trabalhista para o reconhecimento de eventual violação à legislação trabalhista, previdenciária e desportiva, pela negativa de profissionalização das atletas, quando presentes os requisitos para a formação dos vínculos de emprego desportivos.

Inobstante tais procedimentos de fiscalização das entidades de administração do desporto, da auditoria fiscal trabalhista e do Parquet, devem ser exaltadas iniciativas de clubes que, contratualmente, e por iniciativa própria, garantem a prorrogação de contratos especiais desportivos com as atletas para alcançar, no mínimo, o período de estabilidade previsto no art. 10, II, “b” do ADCT, bem como devem ser incentivadas as negociações coletivas com propostas deste mesmo jaez, nos termos autorizativos do art. 7o, XXVI, da CRFB-88.

Conclusão

Sabe-se que o mercado de trabalho de todas as mulheres ainda é um solo fértil para práticas discriminatórias, tanto que as mulheres, mesmo que ocupem a mesma posição na carreira que os homens, não raro, recebem salários inferiores.[15]

O mercado de trabalho ainda acredita que a mulher produz menos, pode menos, contribui menos e o papel do homem é supervalorizado, o que não acarreta benefícios para nenhum dos dois componentes, muito menos para a economia e para a sociedade. No desporto, tal realidade não é diferente, sendo que o desporto feminino vem tentando obter seu espaço perante o público, a mídia e os patrocinadores, mas o desafio é imenso, haja vista os obstáculos históricos que o desporto feminino teve que enfrentar no século passado. Ao contrário do que se pensa, o desporto feminino tem seu público próprio, o que se prova até pelas redes sociais, em que os maiores talentos do esporte feminino tem milhões de seguidores, demonstrando que o segmento só precisa ser mais valorizado, para que possa desabrochar.

Neste cenário de dificuldades, soma-se a questão da maternidade.

A maternidade não é só da mulher, pois sem este fenômeno a população  regredirá numericamente e aqueles que podem atuar ativamente no mercado de trabalho ocuparão menos espaços; a sociedade começa a envelhecer e não haverá substituição desta mão de obra. Sem a maternidade, a perpetuação da família, que é a base da sociedade, fica prejudicada.

A mulher, ao se inserir no mercado de trabalho, enfrenta inúmeras barreiras, sejam familiares, sociais, econômicas e também raciais. O preconceito que recai sobre a mulher que pretende lançar-se no mercado de trabalho é dos mais variados matizes e com a atleta profissional não é diferente.

A mulher ainda tem que atender à conciliação entre as atividades profissionais e o tempo destinado às atividades domésticas, aos trabalhos de cuidado com a família e com os filhos. No desporto, a dificuldade se densifica, pois o físico é o instrumento de trabalho das mulheres atletas, e a maternidade modifica o corpo e dificulta ou impede o alto rendimento.

Para um atleta de alto rendimento, um atleta profissional, as horas de dedicação consomem grande parte do dia, a alimentação é um fator decisivo, assim como o estado psíquico.

Valorosa e importante a fala de Leonardo Coelho de Oliveira, Coordenador do departamento do futebol feminino do Club Athlético Paranaense [16] em live organizada pela ANDD (Academia Nacional de Direito Desportivo), ao mencionar que percebe diariamente o comprometimento e a dedicação das atletas mulheres. Para elas, uma segunda chance seria impossível ou muito difícil, e, com isso, a dedicação aumenta.

O teto de vidro é uma barreira translúcida, invisível, que impede as profissionais mulheres que se lançam ao mercado de trabalho de progredir, de ousar, de assumirem cargos de chefia, de se especializarem. Muitas desistem dos sonhos profissionais em função da família e da maternidade. E para as profissionais do ramo esportivo, o teto deixa de ser de vidro e passa a ser de material mais robusto, de metal, cuja dificuldade de quebrar é ainda maior, já que a mente, o corpo e vida privada precisam contribuir para que o trabalho seja realizado.

A barreira para a atleta que tenta conciliar a atividade profissional e as atribuições pessoais e domésticas é maior, já que esta profissional visa quebrar recordes, dar o melhor de si. É ainda maior porque algumas modalidades esportivas, desde seu nascedouro, foram espaços ocupados apenas por figuras masculinas, como o futebol, o vôlei, a natação, as lutas e outras modalidades.

Na esteira dos estudos realizados pela professora Heleieth Saffioti, na obra A mulher na sociedade de classes – mito e realidade :

“As relações entre os sexos e, consequentemente, a posição da mulher na família e na sociedade em geral, constituem parte de um sistema de dominação mais amplo. Assim sendo, o exame do tópico enunciado exige que se caracterize a forma pela qual se organizava e distribuía o poder na sociedade escravocrata brasileira, época em que se formaram certos complexos sociais em nome da tradição. À luz desta tradição procurar-se-á encontrar explicações para a vigência, ainda hoje, dos mitos e preconceitos através dos quais a sociedade atual tenta justificar a exclusão da mulher de determinadas tarefas e mantê-las, assim, no exercício quase exclusivo de seus papéis tradicionais e das ocupações reconhecidamente femininas.”

No esporte, também existem espaços reconhecidamente masculinos e ocupações reconhecidamente masculinas. Grande parte da sociedade, como forma de preconceito, entende que a menina que gosta de futebol não é feminina, a menina que pretende tornar-se nadadora profissional não terá um corpo feminino, a menina que gosta de judô não é meiga e doce.

A emoção e a sensação de pertencimento que o esporte produz é feminino e masculino, pois é, antes de tudo, humano e dignificante.

O esporte torna o ser humano mais digno, pois ensina a criança a ganhar, a perder, a torcer, a respeitar a vitória do adversário, a superar obstáculos, a vibrar com a conquista e a se emocionar com a derrota. Estas emoções podem, e devem, fazer parte da atividade profissional, tanto de homens, como de mulheres, desde que esta seja a escolha da pessoa.

Uma mulher, atleta, mãe, tem muito a contribuir com a sociedade e com a economia, e ao reproduzirmos os papéis tradicionalmente definidos em um passado remoto, mas que ainda faz-se presente em muitos espaços privados e coletivos, perdemos “nossa riqueza de talento”, como mencionado alhures por Sydney Leroux Dwyer, em conta do Twitter (fevereiro de 2020).

O esporte brasileiro não precisa desperdiçar o talento de suas atletas, pois ainda que o ápice da carreira coincida com o ápice da fertilidade feminina, o Estado Brasileiro poderá (deverá) suprir a lacuna deixada, se for o caso, pelo lapso temporal transcorrido no bojo de um contrato esportivo firmado a termo e além, pelo período de estabilidade constitucional, caso o contrato tenha terminado, como um encargo previdenciário que é.

Neste cenário, há seis pilares a serem fundados e densificados: a necessidade de reconhecimento da profissionalização; a vedação de cláusulas discriminatórias à maternidade; a fiscalização, se necessário, repressiva; a valorização do desporto feminino e o seu potencial; a proteção estatal e das entidades de administração do desporto e o fomento às boas práticas individuais e coletivas.

A realidade é que o trabalho feminino, com a força de suas atletas, é capaz de ultrapassar a barreira do preconceito e a proposição que fazemos neste trabalho é que nos contratos desportivos femininos seja garantida a proteção dos patamares econômicos das atletas. Tais objetivos estarão mais próximos com a garantia da profissionalização; com a proteção estatal previdenciária; com a vedação de cláusulas discriminatórias à maternidade nos contratos desportivos, de cessão do uso da imagem e de patrocínios;  com a inclusão de cláusulas coletivas ou individuais de manutenção do emprego e do patamar econômico da atleta durante o afastamento previdenciário e do período de estabilidade provisória destinado à gestante.

O desenvolvimento do desporto feminino é um processo fisiológico natural da evolução da sociedade, seja no aspecto profissional, seja no seu aspecto de enriquecimento plural. A maternidade, como parte indissociável desta evolução sociopolítica cultural da sociedade, não deve representar um dilema profissional às atletas, nem uma dúvida, mas um evento natural que somente as engrandece como seres humanos, garantidos os papéis de mães e profissionais desportistas.

 

Bibliografia

 

ALMEIDA, Auriel de. Evas do Gramado. Hanoi, 2017.

DANI, Marcos Ulhoa. Transferências e Registros de Atletas Profissionais de Futebol – Responsabilidades e direitos - 2a Edição - São Paulo: Ltr, 2019.

FIUZA, César. Direito civil: curso completo. 18a edição revista, atualizada e ampliada. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2015.

PISANI, Camila. Mulheres no esporte: diferença de gênero, diferença em números in Elas escrevem sobre Direito Desportivo. Coordenação: VIANNA, Vanessa de Castro; MEIRELLES, Julia Galhego; DOS SANTOS, Desirée Emmanuelle Gomes; NOGUEIRA, Caroline. Organização: SÁ FILHO, Fábio Menezes de. Recife: Editora dos Organizadores, 2019.

SAFFIOTI, Heleieth, A mulher na sociedade de classes – mito e realidade, Expressão popular, São Paulo, 2013.

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http://www.tst.jus.br/-/gestante-admitida-por-contrato-de-experiecia-consegue-direito-estabilidade-provisoria

https://www.brasildefato.com.br/2019/06/13/futebol-feminino-surge-nos-anos-20-e-proibido-ate-79-e-enfrenta-ate-hoje-o-machismo

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https://fifpro.org/en/industry/after-coronavirus-women-players-seek-better-conditions-and-respect

https://www.hypeness.com.br/2019/05/nike-corta-70-do-salario-de-atletas-gravidas-negociacoes-sao-feitas-por-homens/

Live - ANDD: Os Desafios do Futebol Feminino. Disponível em: undefined

[1]     ALMEIDA, Auriel de. Evas do Gramado, Hanoi: 2017.

[2]     Publicada no Diário Oficial da União sob a nomenclatura de ‘deliberação CND 01/83’  - Diário Oficial da União.

[3]     PISANI, Camila. Mulheres no esporte: diferença de gênero, diferença em números in Elas escrevem sobre Direito Desportivo. Coordenação: VIANNA, Vanessa de Castro; MEIRELLES, Julia Galhego; DOS SANTOS, Desirée Emmanuelle Gomes; NOGUEIRA, Caroline. Organização: SÁ FILHO, Fábio Menezes de. Recife: Editora dos Organizadores, 2019, p. 84.

[4]     Vale mencionar o ponto de intercessão que une o preconceito com relação a mulheres e negros, tanto que os negros foram alijados pela Associação Metropolitana de Esportes Atléticos (AMEA), na década de XX, associação composta pelos times cariocas Fluminense, Flamengo e Botafogo, dentre outros, o que fez com o que o Vasco, à época, não participasse do campeonato carioca, pois não aceitou dispensar os jogadores negros de sua equipe. Times como o Bangu-EJRJ, o Vasco da Gama-RJ e o Ponte Preta-SP foram pioneiros na escalação de jogadores negros e combate a discriminação racial no futebol.

[5]     Disponível em https://fifpro.org/en/industry/after-coronavirus-women-players-seek-better-conditions-and-respect – acesso em 19/08/20.

[6]     Disponível em https://www.hypeness.com.br/2019/05/nike-corta-70-do-salario-de-atletas-gravidas-negociacoes-sao-feitas-por-homens/- Acesso em 19/08/20.

[7]     Disponível em https://brasil.elpais.com/brasil/2019/08/18/deportes/1566133455_744393.html– Acesso em 20/08/20.

[8]          A maternidade das atletas de alto rendimento. Portal Terra. Disponível https://www.terra.com.br/noticias/dino/a-maternidade-das-atletas-de-alto-rendimento,ef1c9312c26caac816123b1c7b010ecd0n13x7ag.html. Acesso em 07/08/2020.

[9]     Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=449079 – Acesso em 20/08/20.

[10]   FIUZA, César. Direito civil: curso completo. 18a edição revista, atualizada e ampliada. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2015, pág. 597.

[11]   FIUZA, César. Op. Cit., págs. 601 a 603.

[12]       Disponível em Instagram @dibradoras – Acesso em 19/08/20.

[13]   Disponível em https://conteudo.cbf.com.br/cdn/201907/20190705112909_106.pdf- Acesso em 20/08/20.

[14]   DANI, Marcos Ulhoa. Transferências e Registros de Atletas Profissionais de Futebol – Responsabilidades e direitos - 2a Edição -São Paulo: Ltr, 2019, págs. 24/25.

[15]          Publicado em 08/03/2019 - 14:10 Por Nielmar de Oliveira - Repórter da Agência Brasil - Rio de Janeiro . Um estudo feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra que as mulheres ganham menos do que os homens em todas as ocupações selecionadas na pesquisa. Mesmo com uma queda na desigualdade salarial entre 2012 e 2018, as trabalhadoras ganham, em média, 20,5% menos que os homens no país.

[16]   Live - ANDD: Os Desafios do Futebol Feminino. Disponível em: undefined – Acesso em 24/08/20

 

Justiça do Trabalho celebra conciliação sobre o retorno das aulas na rede privada do DF

Ontem, dia 24/08/2020,  foi realizada uma conciliação no emblemático caso de retorno às aulas na rede privada do Distrito Federal. 

Foi uma audiência longa, que durou de 16h às 23:50h! Uma audiência intensa, com ampla participação do Ministério Público do Trabalho e dos Sindicatos Patronal e Profissional. 

O tema da volta às aulas durante a pandemia é extremamente importante, talvez um dos mais importantes julgados na 10ª Região nos últimos anos, e despertou manifestações acaloradas na imprensa, nas redes sociais, etc. A conciliação, portanto, foi importantíssima para trazer segurança à sociedade e apaziguar os ânimos da famílias, escolas, professoras e professores, auxiliares de ensino. É um acordo que pode servir de baliza para outros entes da Federação.

Temos certeza que a conciliação decorreu, entre outros fatores, como a boa vontade e afinco das partes e dedicação e esforço do Ministério Público do Trabalho,  diretamente também da calma e do preparo dos Magistrados que a conduziram: o Desembargador Pedro Foltran, relator do Mandado de Segurança, e o Juiz Antonio Umberto de Souza Júnior, Juiz Titular da Vara da Ação Civil Pública. A atuação deles muito honrou a 10a Região da Justiça do Trabalho! 

O texto da detalhada ata, que trata do calendário e das medidas de prevenção de contágio no ambiente escolar, segue abaixo: 

 

SECRETARIA GERAL JUDICIÁRIA - TP

ATA DE AUDIÊNCIA

PROCESSO - MSCIV 0000577-76.2020.5.10.0000

Impetrante: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO

Autoridade Coatora: JUÍZO DA 6ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA-DF

Autoridade Coatora: DISTRITO FEDERAL

Terceiro Interessado: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO

Terceiro Interessado: SINDICATO DOS ESTABELECIMENTOS PARTICULARES DE ENSINO NO DISTRITO FEDERAL - SINEPE/DF

Relator: DESEMBARGADOR PEDRO LUÍS VICENTIN FOLTRAN

         Aos vinte e quatro dias do mês de agosto de 2020, às 16h, foi aberta a audiência.

       Presentes pelo Impetrante, Ministério Público do Trabalho – MPT, os Procuradores, Dra Geny Helena Fernandes Barroso, Dra. Carolina Pereira Mercante, Dra. Ana Cláudia Rodrigues Bandeira Monteiro, Dr. Ângelo Fabiano Farias da Costa e Dra. Renata Coelho Vieira. Presentes pelo Terceiro Interessado, Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Distrito Federal – SINEPE/DF, o Presidente, Sr. Álvaro Moreira Domingues Júnior, a Vice-Presidente, Sra. Ana Elisa Dumont, o Diretor Financeiro, Sr. Clayton da Silva Braga, e o Diretor Administrativo, Sr. Marcos Scussel, acompanhados dos advogados, Dra. Oneide Sotério da Silva, OAB/DF 24.739, e Dr. Valério Alvarenga Monteiro de Castro, OAB/DF 13.398. Presentes, em caráter excepcional, pelo Sindicato dos Professores em Estabelecimentos Particulares de Ensino do Distrito Federal - SINPROEP/DF, a Presidente, Sra. Karina Barbosa de Jesus da Silva, o Diretor Jurídico, Sr. Rodrigo Pereira de Paula, e o Diretor de Comunicação, Sr. Trajano Silva Jardim, acompanhados do advogado, Dr. Bruno Paiva Gouveia, OAB/DF 30.522. Presente, ainda, o Juiz Antonio Umberto de Souza Júnior, Titular da MM. 6ª Vara do Trabalho de Brasília /DF, relator dos autos da Ação Civil Pública 0000601-86.2020.5.10.0006.

Aberta a audiência, o Exmo. Desembargador Pedro L. V. Foltran cumprimentou os presentes e concedeu a palavra às partes dando continuidade às tratativas conciliatórias iniciadas na audiência do dia 20/8/2020.

Inicialmente, foi esclarecido que o Procurador do DISTRITO FEDERAL colacionou aos autos as informações apresentadas pela Secretaria de Estado da Educação do Distrito Federal, que noticia que "não há previsão de retorno das atividades educacionais presenciais" da rede pública de ensino local e

que o órgão "acompanhará a evolução da curva epidemiológica e boletins emitidos pelos órgãos de saúde habilitados". Acrescenta na manifestação o seguinte: “Ademais, o ente público comunica que as demais informações sobre a testagem dos professores, solicitadas durante a audiência de conciliação realizada no dia 20/08/2020, ainda aguardam manifestação dos órgãos técnicos para que sejam apresentadas nos autos. Destarte, o Distrito Federal entende, respeitosamente, ser prescindível sua participação na composição de acordo sobre a reabertura das escolas privadas, pelo que não participará da audiência de conciliação marcada para hoje, cabendo aos estabelecimentos de ensino e as demais Partes transigirem sobre o tema.”

O SINEPE/DF, após a assembleia da categoria, manifesta concordância com a data de retorno para o dia 21/9/2020 para a Educação Infantil e Ensino Fundamental 1, com apresentação dos professores nos dias 17 e 18/9/2020. Propõe, para o Ensino Fundamental 2 e Ensino Médio e Profissionalizante, o retorno dia 28/9/2020, com a apresentação dos professores nos dias 24 e 25/9/2020.

No que se refere às 6 medidas de profilaxia, assim se manifesta:

  • “Fornecimento de luvas descartáveis, gorros descartáveis, protetores faciais (face shields),jalecos, aventais, ...Covid19;”.

Entende ser exigência excessiva os gorros descartáveis, jalecos, aventais e protetores faciais (face Shields), os quais deveriam ser utilizados somente nos horários de alimentação e cuidados diretos com as crianças)

  • “Exigir o uso dos EPIs … temperatura;”. - Manifesta concordância.
  • “Fornecimento, pelos empregadores, de máscaras aos empregados, … (vide itens 1.7 e 1.8 doDOC. 15).”. - Manifesta concordância.
  • “Limitação máxima de 50% do contingente de alunos por sala em aulas presenciais, …contágio;”. - Relata a dificuldade de aplicação do percentual de 50%. Propõe seja aplicado o distanciamento previsto no Decreto 40.939.
  • “Garantia de testagem PCR de todos os profissionais para a efetiva retomada das atividades.”. Propõe a testagem inicial de sorologia (quimioluminescência). Caso o trabalhador tenha sintomas por ocasião do retorno, poderia ser feita a testagem PCR.
  • Afastamento imediato de trabalhadores e alunos infectados ou que apresentem sintomas daCovid-19, ... contaminação.”. - Manifesta concordância.

Quanto ao Comitê de Fiscalização e Acompanhamento, entende desnecessária a criação, já que sempre se colocou à disposição para colaborar.

Destaca dois pontos que, ainda, não foram discutidos: vigência do acordo e situação das creches.

O SINPROEP/DF, por seu turno, se manifesta nos seguintes termos: Informa que 69,9% dos professores filiados ao sindicato, que responderam à pesquisa (20% do total de professores), são contra o retorno às aulas neste momento. Propõe que o retorno presencial dos professores se dê apenas dois dias antes do início das aulas.

Quanto ao retorno do Ensino Fundamental 2, propõe que ele se dê no dia 13/10, com apresentação dos professores dias 8 e 9/10, e Ensino Médio no dia 28/10, com apresentação de professores nos dias 24 e 25/10.

Pugna pelo mesmo tratamento dado à Educação Infantil às creches, ressaltando que o Ensino Superior já foi solucionado.

Por fim, na tentativa de firmar o acordo, desiste da criação do Comitê de Fiscalização e Acompanhamento.

O MINISTÉRIO PÚBLICO propõe o retorno do Ensino Fundamental 2, dia 19/10, e do Ensino Médio e Profissionalizante, dia 26/10/2020.

Quanto ao fornecimento de equipamentos constante do item 1 das medidas de proteção, esclarece que o gorro descartável poderia ser dispensado, em face da escassez no mercado.

Quanto à testagem, entende pela necessidade do PCR. Sugere que para aqueles que fizeram sorologia em momento anterior, com IgG positivo, seria dispensado o PCR. Para os demais seria necessária testagem pelo PCR.

Com relação ao quantitativo de alunos por sala de aula, insiste na manutenção do percentual já indicado.

Abdicam, nesta oportunidade, da participação no Comitê de Fiscalização e Acompanhamento.

O SINEPE/DF concorda com o cronograma de retorno apresentado pelo MPT. Concorda, ainda, com a limitação de 50% de alunos presentes em sala de aula. Acrescenta, no entanto, que não é possível a testagem por PCR para todos os profissionais, especialmente para aquelas escolas pequenas.

O Juiz Antonio Umberto propõe seja firmado acordo nas questões até aqui negociadas e incontroversas. Com relação à testagem, esclarece que nos autos da Ação Civil Pública em tramitação na 6ª Vara do Trabalho poderá designar perícia para elaboração de laudo relativo ao método de testagem mais adequado para o retorno dos profissionais, caso as partes assim acordem.

Aquiescem as partes com a proposta apresentada pelo Juiz Antonio Umberto.

Assim as partes, incluindo o SINEPE/DF E SINPROEP/DF, firmam acordo nos seguintes termos:

1) Calendário de retorno das atividades presenciais.

- Retorno da Educação Infantil e do Ensino Fundamental 1 no dia 21/9/2020, com apresentação dos professores nas escolas para treinamento nos dias 17 e 18/9/2020.

Retorno do Ensino Fundamental 2, dia 19/10, e do Ensino Médio, Profissionalizante e educação de jovens e adultos, dia 26/10/2020, com apresentação dos professores nas escolas para treinamento nos dias 14, 15 e 16/10/2020 e nos dias 22 e 23/10/2020, respectivamente.

O calendário da Educação Infantil se aplica também às creches particulares não conveniadas devendo ser comunicado o Juízo da MM. 7ª Vara do Trabalho de Brasília, onde tramita a Ação Civil Pública n.º 0000254-50.2020.5.10.0007, proposta pelo SINPROEP/DF.

Caso haja convocação dos professores para semana pedagógica ou outras atividades preparatórias, antes dos treinamentos presenciais, aludidos nesta cláusula, tais atividades serão realizadas de modo telepresencial.

Os profissionais de educação deverão comparecer ao local indicado pelas escolas para realização de testagem para Covid19, conforme comunicado a ser encaminhado a eles diretamente.

Fica estabelecido e declarado que a retomada das atividades presenciais nas escolas abrangidas neste acordo é facultativa para estas e seus alunos.

2) Medidas protetivas.

  • Fornecimento de luvas descartáveis, protetores faciais (face shields), e outros aparatosnecessários para os professores, instrutores e demais profissionais que trabalhem diretamente com alunos da Educação Infantil, por estarem mais sujeitos ao contato com secreções expelidas pelas crianças e, consequentemente, mais expostos ao contágio da Covid-19;

Os gorros, jalecos e aventais serão fornecidos nas situações de alimentação e contato direto com as crianças na higienização delas.

  • Exigir o uso dos EPIs necessários aos trabalhadores (empregados diretos ou terceirizados) obrigatórios para cada tipo de atividade, principalmente para atividades de limpeza, retirada e troca do lixo, manuseio e manipulação de alimentos ou livros e aferição de temperatura;
  • Fornecimento, pelos empregadores, de máscaras aos empregados, adequadas aos graus de riscode contaminação a que o trabalhador estiver exposto e em quantitativo suficiente e que atenda à limitação do período de uso da máscara (vide itens 1.7 e 1.8 do Laudo Pericial de fls.133/134 da petição inicial da Ação Civil Pública n.º 0000601-86.2020.5.10.0006);
  • Limitação máxima de 50% do contingente máximo de alunos por sala em aulas presenciais,prevista na cláusula 31ª da CCT 2019/2021, respeitada metade do limite máximo de ocupação do espaço de cada sala, nos termos da legislação educacional e o distanciamento de 1,5m entre os alunos;
  • Afastamento imediato de trabalhadores e alunos infectados até a plena recuperação;
  • Afastamento imediato de trabalhadores e alunos que apresentem sintomas da Covid-19, até quese submetam a exame específico que ateste ou não a contaminação.

As medidas estabelecidas nesta cláusula não excluem nem afastam a incidência das medidas gerais e específicas estabelecidas no Decreto 40.939 do governo do Distrito Federal e demais normas sanitárias vigentes, bem como se aplicará o regime sancionatório previsto no art. 10 do referido Decreto, sem prejuízo de ajuizamento de ação pelo Ministério Público do Trabalho ou pelo SINPROEP/DF, em caso de descumprimento do presente acordo por qualquer dos estabelecimentos de ensino por ele afetado, inclusive com a imposição de sanções pecuniárias por tal inadimplência, ou transação extrajudicial.

As medidas até aqui acordadas vigoram até o dia 31 de dezembro de 2020.

  • Testagem da Covid 19. Negócio Processual.

Nos termos do art. 190 do CPC, as partes, incluídos o SINEPE/DF e o SINPROEP/DF, neste ato estabelecem negócio processual pelo qual aceitam previamente, com renúncia a recursos, a sentença parcial remanescente a ser proferida com objeto exclusivo de definição do método de testagem a que deverão ser submetidos os profissionais de educação para o retorno às atividades presenciais, a ser prolatada após a realização de perícia, ficando as partes desde já intimadas para indicarem os quesitos, no prazo de 5 dias úteis, a partir da homologação do presente acordo, na Ação Civil Pública n.º 000060186.2020.5.10.0006.

  • Mandado de Segurança. Perda de objeto.

Com a homologação do presente acordo, o presente Mandado de Segurança perderá o objeto.

  • Homologação do acordo. Necessidade de anuência do Distrito Federal.

A homologação do presente acordo depende de anuência do Distrito Federal, que será intimado a se pronunciar, considerando a urgência da medida, em 24h, nos autos da Ação Civil Pública 000060186.2020.5.10.0006, presumindo-se a plena concordância em caso de silêncio.

6) Incidentes processuais. Desistência.

Com a homologação do acordo, as partes, inclusive o SINEPE/DF e o SINPROEP/DF, desistem de todos os recursos, impugnações, reclamações constitucionais, conflitos de competência, correições parciais e quaisquer outros incidentes fundados em decisão proferida no Mandado de Segurança 000057776.2020.5.10.0000 e na Ação Civil Pública 0000601-86.2020.5.10.0006, no prazo de 24h a contar da ciência da homologação.

Os signatários do presente acordo declaram, para todos os efeitos, que o acordo não prejudica o prosseguimento da Ação Civil Pública 0000254-50.2020.5.10.0007 quanto às creches conveniadas ao GDF.

A presente ata documenta também a Ação Civil Pública 0000601-86.2020.5.10.0006, devendo ser inserida nos autos respectivos.

Cientes as partes e o MPT.

           Nada mais.

           Audiência encerrada às 23h50min.

PEDRO LUÍS VICENTIN FOLTRAN

Desembargador Relator

Justiça do Trabalho suspende norma coletiva que previa a redução, durante a pandemia, de verbas rescisórias do setor de bares e restaurantes

O Exmo. Desembargador Alexandre Nery de Oliveira, nos autos de Ação Anulatória de Cláusula Convencional, ajuizada pelo MPT, acolheu o pedido do parquet, que questiona a cláusula de Convenção Coletiva do Trabalho do ramo de bares e restaurantes do DF, e que permitia a redução das verbas rescisórias durante o período de pandemia.

Compreendeu o MM. Desembargador que houve vício formal na celebração do termo aditivo que previu essa redução de verbas, pois realizada apenas pelos dirigentes sindicais, sem qualquer consulta ou deliberação da categoria profissional.

É uma decisão de grande impacto, já que notícias têm destacado o grande número de empregados despedidos nesse segmento.

Conheça abaixo o inteiro teor da decisão:

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA DO TRABALHO

TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO

Gabinete Desembargador Alexandre Nery de Oliveira

AACC 0000601-07.2020.5.10.0000

AUTOR: Ministério Público do Trabalho

RÉU: SINDICATO DE HOTEIS, RESTAURANTES, BARES E SIMILARES DE

BRASILIA, SINDICATO DE EMP NO COM HOT REST BARES LANCHONETES

PIZZARIAS CHUR BOITES COZINHAS IND EMP FORNEC DE REFEICOES – ECT

 

D E C I S Ã O

(PEDIDO LIMINAR – DEFERIMENTO)

                       MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO ajuizou ação anulatória de cláusula convencional em face do SINDICATO DE HOTÉIS, RESTAURANTES, BARES E SIMILARES DE BRASÍLIA – SINDHOBAR e SINDICATO DOS EMPREGADOS NO COMÉRCIO HOTELEIRO, RESTAURANTES, BARES, LANCHONETES E SIMILARES DO DISTRITO FEDERAL – SECHOSC,devidamente qualificados, onde postula a declaração de nulidade do termo aditivo à CCT 2020/2022 convencionado entre os Sindicatos supramencionados, por vício formal insanável, diante da ofensa ao art. 612/CLT, ou mesmo em razão da previsão de redução de direitos rescisórios trabalhistas em decorrência da Pandemia da COVID-19 (supressão do aviso prévio e redução da multa de 40% do FGTS). Pugna pela concessão de liminar em tutela de urgência. Deu à causa o valor de R$ 10.000,00.

                                                                                                                                                     R e l a t a d o s .                                                         

Deci do :

A discussão envolve os termos aditivos à CCT 2020/2022 firmados pelas

entidades sindicais Rés, buscando o pedido inicial, em sede liminar, por invocada nulidade formal ou material, a imediata suspensão do primeiro Termo Aditivo, ou ao menos dos parágrafos 2º a

4º da respectiva Cláusula 1ª, com perda consequente da eficácia do segundo Termo Aditivo.

A CCT-2020/2022 foi firmada em março/2020, enquanto o primeiro Termo

Aditivo,    em     07/04/2020,   e    o  segundo   Termo Aditivo, em       10/08/2020.

Inicialmente, observo que a MP 927/2020, de 22/03/2020, teve vigência encerrada em 19/07/2020, conforme Ato Declaratório 92/2020, de 30/07/2020, do Presidente do Congresso  Nacional .

A MP 936/2020, de 01/04/2020, por sua vez, resultou convertida na Lei nº 14.020/2020.

Por partes.

A MP 927/2020, enquanto vigorou, estipulou condições que, conquanto inseridas no Termo Aditivo à CCT/2020 firmado pelas entidades Rés, sucumbe como justificativa à adoção da norma coletiva referida .

A MP 936/2020, por sua vez convertida na Lei nº 14.020/2020.

A inicial do Ministério Público invoca a nulidade formal total do primeiro Termo Aditivo, sob manto de irregularidade formal à luz do artigo 612 da CLT, inclusive considerando que quando da pactuação em 07/04/2020 já vigorava o artigo 17, II, da MP 936/2020 que asseverou a possibilidade de uso de meios eletrônicos para o atendimento aos requisitos alusivos à convocação, deliberação, decisão, formalização e publicidade de convenção ou de acordo coletivo de trabalho, enquanto no caso teria sido adotada fórmula de aprovação apenas pelos dirigentes sindicais signatários.

Sucessivamente, o Ministério Público invoca haver, quando menos, nulidade material do contido na Cláusula 1ª, §§ 2º a 4º do referido primeiro Termo Aditivo à CCT 2020 /2022 quando afastou (1) a multa do artigo 479 da CLT, (2) reduziu a indenização compensatória por demissão imotivada correspondente à metade do valor do FGTS (assim 20% invés de 40% do valor do saldo fundiário devido) e (3) considerou não ser devido pagamento de aviso prévio i n d e n i z a d o .

Por fim, considerando o aspecto decorrente, busca a perda de eficácia do segundo termo aditivo à CCT 2020/2022, ou quando menos do considerando que indicaria atuação    proativa  do procurador    do trabalho referido.

O artigo 30 da MP 927/2020 asseverava que “Os acordos e as convenções coletivos vencidos ou vincendos, no prazo de cento e oitenta dias, contado da data de entrada em vigor desta Medida Provisória, poderão ser prorrogados, a critério do empregador, pelo prazo de noventa dias, após o termo final deste prazo.” Nesse efeito, o que se permitia não era a prorrogação indistinta das normas coletivas, mas sua consideração de prorrogação a critério dos próprios empregadores, como cláusulas aderidas “pro tempore” aos contratos individuais de trabalho. Nada, assim, a considerar-se em relação à prorrogação indistinta para toda a categoria, mas apenas no âmbito das relações individuais de trabalho e a critério, repita-se, dos próprios empregadores.

Ademais, a questão contida na adoção do primeiro Termo Aditivo à CCT 2020 /2022 não envolveu prorrogação de efeitos, mas estipulação de novos normativos.

Nesse sentido, já encontrou a adoção do referido Termo Aditivo o regramento contido no artigo 17, II, da MP 936/2020, inclusive por anterior à própria subscrição do aditivo descrito, verbis:

Art. 17. Durante o estado de calamidade pública de que trata o art. 1º desta Lei:

(…)

II – poderão ser utilizados meios eletrônicos para atendimento aos requisitos formais previstos no Título VI da CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, inclusive para convocação, deliberação, decisão, formalização e publicidade de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho;

(…)”

A manifestação do sindicato patronal, então em sede de inquérito civil instaurado pelo MPT, já evidencia que não houve uso de meios eletrônicos para a convocação e deliberação das categorias, situando-se o Termo Aditivo em confessada atuação restrita de seus dirigentes, fora, assim, das exigências legais, que não foram revogadas pela legislação excepcional do período de pandemia.

Tenho, nesse efeito, como configurado o fumus boni iuris e o periculum in mora para a concessão da tutela provisória requerida pelo Parquet, eis que inequivocamente a persistência do primeiro Termo Aditivo resulta efeitos por norma firmada fora de padrões estabelecidos, com risco à segurança jurídica para toda a categoria envolvida.

Concluindo, em exame inaudita altera pars, e sem prejuízo de posterior reexame quando apresentadas as defesas, DEFIRO O PEDIDO LIMINAR para imediatamente suspender a validade e eficácia do primeiro Termo Aditivo à CCT-2020/2022 firmada pelos Sindicatos Réus, consequentemente assim restado suspensa igualmente a eficácia do segundo Termo Aditivo, até final decisão no processo decorrente da presente ação anulatória de normas coletivas, nos termos da fundamentação.

Intime-se o Autor.

Citem-se os Réus, cientificando-os, ainda, do deferimento do pedido liminar, para, querendo, contestar, no prazo de 15 (quinze) dias, os pedidos formulados pelo Autor, assim devendo acompanhar o instrumento de citação, além da contrafé da exordial, também o inteiro teor  desta decisão.

 

Brasília-DF, 17 de agosto de 2020.

ALEXANDRE NERY DE OLIVEIRA

Desembargador do Trabalho

Quer mais segurança para sua empresa receber notificações e intimações?

Já pensou se a sua empresa receber uma notificação postal e o empregado responsável, sem querer, deixa de repassá-la ao órgão responsável? Ou se a publicação foi feita pelo Diário da Justiça e o serviço “informador” não repassa ao advogado a informação? Esses equívocos podem levar a revelias e perdas de prazos processuais, com prejuízos altíssimos, às vezes incomensuráveis.

Por outro lado, você sabia que a sua empresa pode ser citada ou intimada diretamente no sistema PJE, de forma centralizada e com segurança? A partir da intimação ou citação, a empresa tem 10 (dez) dias para abrir a intimação, sendo que após esse prazo, é dada por notificada. É um prazo maior que o prazo do DJ, no qual as publicações geram são feitas um dia após a assinatura do ato, e às vezes até maior que o prazo do ato postal.

Com isso, a chance de equívocos diminui sobremaneira, sem contar que há diminuição de ônus do Judiciário com as citações postais, valores que podem ser direcionados à melhoria das instalações e serviços jurisdicionais. É de interesse, portanto, de toda a sociedade.

Essa notificação pelo PJE, antes destinada aos entes da Administração Pública Direta, Autárquica e Fundacional, MPT e DPU, há algum tempo está disponível para as empresas em geral.

Também existe a opção de receber a citação (e não apenas as intimações) pelo DEJT (Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho), mediante cadastramento do advogado responsável.

Ficou interessado? Basta preencher o termo de cadastramento e enviar com alguns poucos documentos ao TRT. Para saber mais, acesse o link https://www.trt10.jus.br/servicos/sistemas/Comunicacao_Eletronica_PJE/?idTRT10M=135. Nele o sistema é explicado, e há o formulário respectivo.

Justiça do Trabalho do DF revoga liminar que suspendia funcionamento das escolas da rede privada

A MM. Juíza do Trabalho Adriana Zveiter, Juíza do Trabalho Auxiliar da 6ª Vara do Trabalho de Brasília/DF, revogou a liminar relativa à suspensão das aulas na rede privada de ensino.

 

Segundo a Magistrada, a “situação atual requer alerta e cuidado”, sendo que a grande controvérsia entre os entre os administradores públicos e seus próximos passos no combate à pandemia traz uma inegável incerteza social à população. Destacou que o Judiciário detém papel importante no abrandamento da crise política, pacificando entendimentos, mas sem que isso resvale para uma distorção institucional.

 

Em sua decisão a Magistrada discorre sobre as funções dos três poderes, e aponta a função do Chefe do Executivo para editar atos normativos na forma de decreto, reconhecendo a competência do Governador do DF para edição de normas reguladores que visem o controle da contaminação pelo coronavírus.

 

A Magistrada registrou que, nessa linha de entendimento, quase todas as medidas defendidas pelo MPT em sua petição inicial da ação civil pública foram também exigidas pelo Decreto Governamental 40939/2020, e que “muitos pais necessitam do estabelecimento (escola) aberto, pois já retornaram ao trabalho e não têm onde deixar os filhos”, sendo que estão mais seguros na escola, sjeita à fiscalização dos órgãos competentes, do que com “terceiros, sem qualquer treinamento e consciência de protocolos mínimos de segurança”.

 

Ao final, a Magistrada revogou a decisão liminar antes proferida e autorizou a imediata reabertura das atividades presenciais de ensino da rede particular do DF, salvo aquelas abrangidas pela decisão proferidas na ACP 254-50.2020.5.10.0007 (creches).

 

Leia a decisão na íntegra:

 

PODER JUDICIÁRIO

 

JUSTIÇA DO TRABALHO

 

TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO

 

6ª Vara do Trabalho de Brasília - DF

 

ACPCiv 0000601-86.2020.5.10.0006

 

AUTOR: Ministério Público do Trabalho

 

RÉU: DISTRITO FEDERAL

 

Vistos etc.

 

Da Revisão da Tutela de Urgência concedida em Plantão Judiciário

 

Considerando os termos da petição do Distrito Federal informando que não irá elaborar novo calendário escolar, passo ao necessário exame da tutela provisória requerida pelo Ministério Público, para fins de definição da manutenção ou suspensão da tutela de urgência deferida em Plantão Judiciário.

 

Nos termos do artigo 296 do CPC é lícito ao juiz rever a tutela provisória a qualquer tempo.

 

Art. 296. A tutela provisória conserva sua eficácia na pendência do processo, mas pode, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada.

 

Não se pode olvidar que a atuação do juiz em regime de plantão judiciário é limitada, como bem ressaltado na própria decisão liminar proferida nestes autos:

 

“Diante  disso,   eventual   intervenção   deste   juízo,   especialmente   considerando tratarse de plantão judiciário para questões absolutamente urgentes, se for o caso, deve ser  a  menor  possível,  seja  para  não  interferir  na  esfera  do  Executivo  Federal,  seja para não  causar  mais  confusão  e  desinformação,  seja para  preservar  a  competência  do  juiz natural da causa após cessado o plantão judiciário” (fl. 145).

 

“Tal medida pode ser revertida e/ou ampliada a qualquer momento pelo juízo natural da causa, se entender de modo diverso” (fl. 155)

 

Assim, considerando que  tutela  provisória de urgência foi concedida inaudita altera pars, em regime de plantão judiciário desprovido de maiores informações, bem como, considerando os novos elementos trazidos aos autos pelo SINEP, na condição de amicus curiae, o espectro se amplia e autoriza nova análise pelo juízo natural da causa no que tange ao pedido de tutela emergencial formulado pelo Ministério Público.

 

Nesse diapasão, passo a decidir sobre o pleito cautelar postulado pelo Ministério Público do Trabalho na presente Ação Civil Pública, no sentido de que seja suspensa a abertura das atividades presenciais nas escolas particulares do Distrito Federal, igualando-se ao calendário escolar das Escolas Públicas.

 

Tutela de Urgência – Análise Preliminar

 

Trata-se de Ação Civil Pública, com pedido de antecipação de tutela, ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) em desfavor de Distrito Federal (DF), no período do plantão judiciário e distribuída à esta MM. 6a Vara do Trabalho de Brasília.

 

O relatório está historiado na decisão liminar de fls.137/156, nos termos a seguir transcritos:

 

“Em sua petição inicial, o autor afirma que criou um grupo de trabalho para monitorar e dialogar sobre as condições de trabalho nas unidades escolares do Distrito Federal relativamente às medidas para a redução dos impactos negativos da pandemia da Covid19 na saúde dos trabalhadores. Cita recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) relativa ao isolamento social e ao achatamento da curva numérica da epidemia para ganhar tempo e reduzir a pressão nos sistemas de saúde. Destaca que referido organismo adverte que escolas e empresas deveriam ser as últimas coisas a serem reabertas em um país. Apresenta dados estatísticos no Brasil e no DF acerca dos casos do novo coronavírus (SARS-Cov-2) e adverte que esta unidade da federação encontra-se no pico da pandemia e que na terça-feira a taxa de ocupação das unidades de terapia intensiva (UTIs) com suporte de ventilação mecânica era de 84%. Transcreve reportagem que aponta que, naquele dia, havia 43 pessoas com diagnóstico confirmado ou suspeito de SARS-Cov-2 na lista de espera por um leito de UTI.

 

O autor sustenta que, apesar de um “cenário de agravamento da crise sanitária no Distrito Federal”, o réu publicou o Decreto 40.939/2020 que permitiu a reabertura de diversos estabelecimentos, entre os quais, os de ensino da rede privada, a partir da próxima segunda-feira, dia 27/7/2020. Aduz que, em face da preocupação do ápice da pandemia e que as regras estabelecidas pelo réu não indicam padrões específicos e pormenorizados de higienização e uso de equipamentos de proteção, passou a fazer reuniões com os agentes envolvidos e interessados para dialogar estratégias de atuação que garantisse o direito à saúde dos trabalhadores. Menciona trechos de atas e resultado de pesquisa realizada, relata situação que levou a novo fechamento de escola, invoca manifestação de sociedade de pediatria e ressalta decisão diversa em outra unidade da federação e o medo dos profissionais da educação. Pondera sobre a existência de calendário distinto das escolas publicas, com retorno gradual e em data posterior: 31/8 para estudantes da educação de jovens e adultos (EJA) e do ensino profissionalizante, 8/9 para o ensino médio, 14/9 para os últimos anos do ensino fundamental e 21/9 para os demais anos, 28/9 para a educação infantil e 5/10 para os centros de ensino especial e educação precoce.

 

O autor lembra que, em reunião com a Secretaria de Educação do réu, recomendou a unificação dos cronogramas de retorno às aulas das redes privadas e pública e a elaboração de protocolo de biossegurança para toda a rede de ensino, mas que, em resposta, o réu decidiu manter a liberação das atividades presenciais nas escolas da rede privada a partir de 27/7/2020 e esclareceu que as escolas particulares têm autonomia para fixarem “o seu cronograma de retorno” e que foi elaborado um protocolo de retomada dessas atividades presenciais. Sustenta que esse protocolo contém inconsistências, que as medidas previstas são insuficientes e que não possui detalhamentos essenciais para se evitar o contágio e os impactos negativos dessa enfermidade. Acrescenta que:

 

“Se a liberação de retorno das aulas presenciais não estivesse prevista para o pico da pandemia no DF e em data iminente (27-07-2020, próxima segunda-feira), haveria tempo hábil para que o MPT prosseguisse com o diálogo interinstitucional e requisitasse administrativamente o aprimoramento do protocolo apresentado pela SEE-DF. A par disso, a reabertura das escolas particulares apenas poderia ocorrer após o efetivo treinamento dos trabalhadores acerca das regras contidas no protocolo, além da comprovação de adequação estrutural das unidades escolares e da ampla divulgação e orientação sobre essas regras a pais/responsáveis e alunos. Contudo, tendo sido mantida, pelo GDF, a liberação do retorno imediato das aulas para a próxima segunda-feira, a situação mostrase periclitante, competindo a este Órgão Ministerial pleitear as medidas judiciais emergenciais cabíveis” (há grifos e destaques no original).

 

O autor menciona matéria jornalística que trata do tratamento não uniforme pelas escolas particulares, com algumas optando pelo regresso das atividades presenciais. Assim, entende que cabe uma resposta efetiva desse Judiciário Trabalhista na “prevenção da lesão ao ordenamento jurídico-social” para que se possa garantir o direito fundamental à saúde de milhares de trabalhadores da educação privada do DF e, consequentemente, de milhares de alunos e seus familiares. Requer a concessão de liminar inaudita altera pars pa ra determinar que o réu, no prazo de 24h, i) “expeça ato normativo que suspenda a permissão” de retorno das aulas presenciais a partir de 27/7/2020, conforme previsão do Decreto 40.939/2020, “nas escolas particulares de Ensino Básico do Distrito Federal”, com o estabelecimento de cronograma de retorno das aulas presenciais na “Rede Privada de Ensino” semelhante ao da Rede Pública de Ensino, caso presente as condições necessárias para segurança no ambiente escolar; ii) expeça ato normativo que contenha novo protocolo de saúde e de segurança aplicável a estabelecimentos de ensino privados, com regras setorizadas e cogentes, que contenha 66 exigências que relaciona, obrigando o réu a fiscalizar seu efetivo cumprimento, sob pena de multa astreintes cumulativa por cada item descumprido. Adverte que a tutela postulada não impede a continuidade das escolas particulares no ensino remoto enquanto perdurar a pandemia da Covid-19. Ao final, postula a condenação do réu, de forma definitiva, nessas obrigações de fazer. Dá à causa o valor de R$ 100.000,00 e junta documentos”.

 

Em cognição primária foi reconhecida a competência da Justiça do Trabalho, com fundamento jurídico no artigo 114, IX da Constituição Federal c/c arts. 5º, II, “d” e III, “d” e 83, III, da Lei complementar 75/1993, aliado à Súmula 736 do STF e concedida parcialmente a tutela de urgência para “tão-somente, suspender por 10 (dez) dias, a contar de 27/7/2020, o retorno das atividades de ensino presencial na rede particular de ensino do Distrito Federal (educação básica e superior) estabelecidas pelo Decreto Distrital 40.939/2020, sem prejuízo da revisão da presente medida, a qualquer tempo, pelo Juiz natural da causa, e mantendo- se, na íntegra, os poderes do Exmo. Sr. Governador do Distrito Federal na gestão das medidas de enfrentamento da pandemia do novo coronavírus na área de educação”.

 

Pois bem.

 

A matéria discutida nos presentes autos é direcionada à proteção à vida e à saúde do trabalhador, na qualidade de direito fundamental expresso na Constituição Federal.

 

Expõe a inicial que “a circunstância exige prevenção da lesão ao ordenamento jurídico-social, impondo-se uma resposta efetiva por parte do Poder Judiciário, para que milhares de trabalhadores da educação privada no DF e, consequentemente, milhares de alunos (crianças e adolescentes), bem como os seus respectivos familiares, tenham seu direito fundamental à saúde efetivamente garantido”.

 

Não se questiona que a proteção à vida e à saúde é um direito fundamental e, consequentemente, merece proteção máxima.

 

Os direitos fundamentais estão lastreados na necessidade de proteção da dignidade da pessoa humana e, como, tal, merece proteção Estatal.

 

O direito à saúde está protegido pela Carta Maior no título referente aos direitos e garantias fundamentais, estabelecendo, em seu artigo 6º que “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.

 

E dentro deste contexto de garantia à saúde como direito fundamental da República, a Carta Política se preocupou em assegurar aos trabalhadores um meio ambiente laboral livre de riscos:

 

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

 

XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;

 

A Constituição Federal possui um amplo catálogo de direitos sociais e dispõe de um enorme leque de normas referentes aos direitos dos trabalhadores. E como visto acima, um ambiente de trabalho digno e livre de riscos é direito do trabalhador.

 

Por outro lado, o direito à saúde está previsto no artigo 196 da Constituição Federal como um direito de todos e dever do Estado, garantido mediante “políticas sociais e econômicas que visem à redução de risco de doenças e de outros agravos”.

 

Pelo exposto, não se pode negar que a questão em análise possui relevância suprema, já que diretamente relacionada a direitos fundamentais previstos e assegurados na Carta Maior.

 

Não obstante, não é demais ressaltar não caber ao Judiciários formular políticas sociais e econômicas direcionadas à saúde. Sua atuação fica limitada à averiguação, nas políticas públicas eleitas pelos órgãos competentes, da presença dos ditames constitucionais de proteção à vida, à saúde, ao meio ambiente laboral e, em um espectro mais amplo, da existência de normas que permitam o acesso universal e igualitário do cidadão a estes direitos.

 

E é justamente isto que se discute na presente Ação Civil Pública, em que se questiona a legalidade da medida adotada pelo Governo do Distrito Federal em liberar a abertura das escolas particulares em momento que se diz ser o “pico da pandemia”, e em que o Distrito Federal se depara com “taxa de ocupação de leitos de UTIs com suporte de ventilação mecânica de cerca

 

de 84%”.

 

O Ministério Público do Trabalho aponta a preocupação dos professores com o retorno das aulas presenciais neste momento de ápice da pandemia do Covid-19 alegando que as regras de segurança estabelecidas pelo Governo do Distrito Federal não indicam padrões específicos e

 

pormenorizados de higienização e de utilização de equipamentos de proteção.

 

Por esta razão, pugna pela concessão liminar para que sejam atendidos os pedidos elencados nos itens expostos na inicial com observância de 66 itens como protocolos de saúde e segurança.

 

É fato público e notório a crise sanitária que assola o mundo em decorrência do alastramento do novo Coronavírus (SARS-CoV-2), crise esta que ensejou a adoção de inúmeras medidas sanitárias visando evitar ou diminuir a propagação do vírus entre a população.

 

Os diversos países atingidos adotaram diferentes protocolos sanitários, com medidas restritivas e de isolamento social, em atenção à realidade de cada Nação, baseados nas recomendações da OMS e diversos estudos científicos que se iniciaram no intuito de desvendar os mistérios enlaçados pelo nefasto vírus. Porém, infelizmente, nenhum estudo conclusivo foi apresentado, inexistindo, por ora, cura para tão infausta doença.

 

A situação requer alerta e cuidado.

 

Ponto forte de polêmica entre o presidente Jair Bolsonaro e vários governadores, o isolamento social é questão de agudos e diários confrontos, gerando incerteza na população sobre a adequada forma de agir e se proteger. Controvérsia espinhosa que agrava a crise social na área de saúde com reflexos nas áreas econômica e política.

 

As divergências políticas acarretam um mal imensurável ao deixar a população órfã de comandos, com inúmeras decisões conflitantes, tanto do judiciário, quanto dos administradores públicos.

 

Estas divergências são retratadas diuturnamente na mídia e afetam a consciência da população não só quanto a gravidade da doença, mas principalmente quanto ao melhor caminho a seguir, pois a ausência de diretriz única quanto ao isolamento e demais medidas de enfrentamento à pandemia, gera inquietação e a preocupação de que a população pode não entender a gravidade da situação.

 

Diante de tanta controvérsia é inegável a incerteza social da população que se depara com a insegurança diária dos próximos passos dos administradores que, por sua vez, constantemente estão sendo impedidos de exercer o comando e direção das medidas necessárias ao combate à pandemia.

 

E no abrandamento da crise política e social que se deflagrou no país, o Judiciário detém importante papel e pode compor a situação, pacificando entendimentos e assim gerar sensação de segurança à população.

 

É notória a disputa política disseminada pela divergência de opiniões quanto às medidas de isolamento social. Neste contexto, é imprescindível a análise jurídica-constitucional sobre a competência para regular e definir atividades essenciais, bem como ditar regras de enfrentamento à crise e flexibilização da quarentena.

 

O Poder Judiciário, para além de exercer seu poder de dizer e interpretar a lei, neste momento de crise deve atuar de modo a criar menos insegurança à população, pois em tempos de turbulência, a sociedade precisa de um norte forte e pacífico para se sentir protegida e amparada.

 

O protagonismo do Poder Judiciário procede da própria Carta Magna que o legitimou para atuar na arena política, visando a proteção dos direitos fundamentais.

 

No entanto, essa legitimação não pode se concretizar como uma distorção institucional, mas, ao contrário, deve se materializar em circunstâncias especiais e definidas, para que não se incorra em um paradoxo político-judicial, em que há confronto direto entre poderes da União.

 

A Constituição brasileira estabelece os contornos e limites institucionais de atuação da política democrática, e o Judiciário é o poder a quem compete garantir a respeitabilidade a esses núcleos constitucionais.

 

A organização e a estrutura do Estado se baseiam em três pilares: forma de governo (República ou Monarquia), sistema de governo (presidencialismo ou parlamentarismo) e forma de Estado (unitário ou Federação).

 

O Brasil adota a forma republicana de governo, com sistema presidencialista e forma federativa de Estado.

 

Relembra Pedro Lenza que as primeiras bases teóricas para a “tripartição de Poderes” foram lançadas na Antiguidade grega por Aristóteles, em sua obra “Política”. Ali o pensador vislumbrava a existência de três funções distintas exercidas pelo poder soberano: a função de editar normas gerais a serem observadas por todos, a de aplicar as referidas normas ao caso concreto (administrando) e a função de julgamento, dirimindo os conflitos oriundos da execução das normas gerais nos casos concretos” (Pedro Lenza, Direito Constitucional, 24ª Ed., Editora Saraiva, pág. 563).

 

A contribuição de Aristóteles foi, inegavelmente, a identificação do exercício de três funções estatais distintas, embora no momento histórico em que formula sua ideia este exercício se concentrava na figura única do soberano.

 

Tempos depois, a teoria aristotélica foi aperfeiçoada por Montesquieu em sua lendária obra “O espírito das Leis”.

 

O grande avanço trazido por Montesquieu não foi a identificação do exercício de três funções estatais. De fato, partindo desse pressuposto aristotélico, o grande pensador francês inovou dizendo que tais funções estariam intimamente conectadas a três órgãos distintos, autônomos e independentes entre si. Cada função corresponderia a um órgão, não mais se concentrando nas mãos únicas do soberano” (Pedro Lenza, obra citada, 563).

 

Assim, com base nessa teoria, cada Poder exerce uma função típica, inerente à sua natureza, de forma autônoma e independente, sendo vedado, portanto, a um único órgão legislar, aplicar a lei e julgar. Esta divisão propicia maior respeitabilidade, independência e autonomia a cada um dos poderes.

 

Nossa Constituição Federal adotou essa teoria e definiu a existência harmônica e independente entre os três poderes da União, na forma do artigo 2º. Esta tripartição dos poderes, certamente foi inspirada pelas reflexões de Montesquieu.

 

A divisão dos poderes visa combater o absolutismo e assim preservar a liberdade individual. Essa independência entre os poderes é vista como garantia de equilíbrio político que minimiza, ou reduz, os riscos do abuso de poder. Importante, também, por estabelecer regime de colaboração entre as várias autoridades estatais, “estabelecendo mecanismos de fiscalização e responsabilização recíproca dos poderes estatais, conforme o desenho institucional dos freios e contrapesos”.

 

Veja-se a respeito a jurisprudência do STF:

 

“EMENTA: (...)A essência do postulado da divisão funcional do poder, além de derivar da necessidade de conter os excessos dos órgãos que compõem o aparelho de Estado, representa o princípio conservador das liberdades do cidadão e constitui o meio mais adequado para tornar efetivos e reais os direitos e garantias proclamados pela Constituição. Esse princípio, que tem assento no art. 2º da Carta Política, não pode constituir em nem qualificar-se como um inaceitável manto protetor de comportamentos abusivos e arbitrários, por pare de qualquer agente do Poder Público ou de qualquer instituição estatal.

 

(...)

 

O sistema constitucional brasileiro, ao consagrar o princípio da limitação dos poderes, teve por objetivo instituir modelo destinado a impedir a formação de instâncias hegemônicas de poder no âmbito do Estado, de modo a neutralizar, no plano político-jurídico, a possibilidade de dominação institucional de qualquer dos poderes da República sobre os demais órgãos da soberania nacional (MS 23.452, Rel. Ministro Celso de Melo, j.

 

16.09.1999, Plenário DJ de 12.05.2000).

 

José Afonso da Silva caracteriza a diferença entre as três funções estatais que são exercidas por seus órgãos, destacando que a função executiva “resolve os problemas concretos e individualizados, de acordo com as leis, mas não se limita à simples execução das leis. A função executiva se distingue em função de governo, com atribuições políticas, colegislativas e de decisão e função administrativa com três missões básicas: intervenção, fomento e serviço público. Já a função jurisdicional, leciona o jurista, “tem por objetivo aplicar o direito aos casos concretos a fim de dirimir conflitos de interesse”. (Curso de direito constitucional positivo, 35 ed., pág. 108).

 

Feitas essas considerações, ressalvo que não se pode negar ao Judiciário o poder de apreciar demandas sobre validade de atos e leis emanadas pela autoridade administrativa competente, sendo impertinentes as críticas nesse sentido. No entanto, essa análise é restrita e deve se lastrear nos limites de sua competência.

 

Em termos específicos ao que aqui se analisa, pode-se afirmar que ao Judiciário é vedado entrar na competência legislativa para definir regras e parâmetros para flexibilização do isolamento social, em especial, no que tange a abertura das escolas particulares.

 

Ao Judiciário caberá apenas a averiguação da observância dos princípios constitucionais assegurados ao cidadão trabalhador, analisando se a norma editada pelo Governador para reabertura das escolas particulares atende ao comando exarado na Constituição Suprema de proteção à saúde do trabalhador e resguardo do direito a um ambiente laboral protegido contra riscos.

 

Não por outro motivo, o Excelso Supremo Tribunal Federal estabeleceu, na análise da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 634, que há competência concorrente da União, dos Estados e dos Municípios para estabelecer atos legislativos e criar políticas públicas para o controle da pandemia em curso no país. Esta decisão foi proferida após tensão política entre o Chefe do Executivo Federal e governadores no tangente ao isolamento social como medida preventiva no combate ao coronavírus.

 

O poder regulamentar é exercido pelo Chefe do Poder Executivo e cabe a ele editar atos administrativos normativos que assumem a forma de decreto. “Essa competência está prevista no inciso IV do art. 84 da Constituição Federal para o Presidente da República, sendo atribuída, por simetria, aos Chefes do Poder Executivo dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, pelas respectivas Constituições e Leis Orgânicas “(Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo, Direito Administrativo; Editora Método, 28ª edição, pág. 277).

 

A Lei Orgânica do Distrito Federal, em seu artigo 100, confere os seguintes poderes ao Governador, dentre outros:

 

“VII - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem com expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução;

 

(...)

 

  • – decretar situação de emergência e estado de calamidade pública no Distrito Federal;
  • – praticar os demais atos de administração, nos limites da competência do PoderExecutivo.

 

No Distrito Federal o governador tem editado decretos que regulamentam o isolamento social, as atividades consideradas essenciais, o fechamento e a abertura do comércio e de parques, bem como, adotado as mais variadas medidas sanitárias , inclusive com exigência do uso de máscara facial em locais públicos.

 

Não há dúvidas acerca da competência do Governador para a edição destas normas reguladoras e para expedição de atos que visem o controle da contaminação pelo coronavírus.

 

As decisões sobre o momento oportuno para flexibilizar ou não a abertura do comércio e das instituições de ensino competem exclusivamente ao administrador, pois é quem melhor detém o conhecimento e acesso às informações técnicas atualizadas sobre a situação em que se enquadra o Distrito Federal em meio à pandemia, inclusive com análise sobre a taxa de ocupação de leitos.

 

O desafio que se impõe, portanto, é saber até que ponto o Poder Judiciário pode rever as decisões dos agentes públicos.

 

A discricionariedade do agente público se pauta pela faculdade que lhe é atribuída para fazer suas escolhas com alicerce em suas qualidades técnicas para apreciação do caso concreto, habilitando-se, portanto, a optar pela melhor solução. A decisão vincula-se ao conhecimento que o administrador detém sobre a situação que lhe é posta, dos elementos objetivos que lhe são apresentados (e que em diversas e constantes situações não são de acesso livre à população) e da noção clara e objetiva dos liames sobre a realidade administrativa que lhe cabe decidir.

 

Logo, a decisão discricionária do administrador público é tomada dentre algumas soluções que podem ser adotadas, e deve sempre observar os ditames legais e visar o interesse público.

 

Nesta conjuntura, a interferência do Judiciário deve limitar-se a análise da legalidade da atuação administrativa, a verificação de que nenhum direito constitucional foi ferido, bem como se estamos ou não diante de um ato arbitrário e ilegal do gestor público.

 

No caso, a autorização concedida pelo executivo para reabertura das escolas particulares do DF, não está eivada de ilegalidade e não afronta dispositivos e princípios constitucionais.

 

Inegável que o governador do Distrito Federal é quem melhor dispõe das informações necessárias para orientar e estabelecer diretrizes a serem seguidas pela  sociedade, no que tange às medidas necessárias a se evitar o contágio com o vírus SARS-CoV-2.

 

Cabe ao administrador, seguindo determinados parâmetros técnicos e jurídicos e com base no conhecimento geral da situação do Distrito Federal, estabelecer as regras que entende satisfatórias e necessárias para atender às necessidades da população, quanto ao prosseguimento das atividades gerais e cotidianas da população sob seu comando.

 

Se por um lado o juiz não pode ficar neutro perante decisões administrativas, por outro não pode atrair para si o papel de escolher medidas que devem ser tomadas com base na solução que entender mais adequada ao jurisdicionado. Não lhe é lícito decidir sobre o que é ou não factível dentro dos limites e conhecimentos técnicos que somente o administrador detém.

 

Assim, somente a ilegalidade aparente com confronto direto às leis e a ditames constitucionais, autorizaria a ingerência do judiciário no comando do controle e enfrentamento à pandemia.

 

No caso, não vislumbro, de imediato, atuação irresponsável, ilegal ou inconstitucional do chefe do executivo do Distrito Federal em autorizar a abertura das escolas particulares.

 

O Ministério Público não levou em consideração as medidas que estão sendo adotas pelas escolas particulares para viabilizar a abertura segura dos estabelecimentos de ensino.

 

Importante ressalvar que ao contrário do alegado na inicial, quase todas as medidas sustentadas pelo Ministério Público do Trabalho como necessárias ao retorno seguro das atividades presenciais nas escolas particulares, estão previstas no Decreto governamental nº 40.939 de 02.07.2020, que fixa protocolos sanitários e medidas de segurança destinadas às instituições de ensino, conforme especificações descritas no anexo único, alínea F e seus subitens.

 

Dentre as medidas estão elencadas estão a necessidade de se garantir a readequação dos espaços físicos, respeitando-se o distanciamento mínimo de 1,5m por estudante; fornecimento aos trabalhadores de equipamentos de proteção individual; disponibilização de álcool em gel 70%; proibição de atividades esportivas coletivas; redução do quantitativo de alunos em salas de aulas, com promoção da alternância entre ensino presencial e remoto; garantia de atividades exclusivamente remotas para alunos e professores que se enquadram no grupo de risco, dentre outras.

 

O SINEP/DF prestou informações valiosas destacando as medidas preventivas que estão sendo adotadas, tais como:  elaboração de guia para reabertura,  cursos e palestras para professores e auxiliares em administração escolar, testagem de funcionários, convênio com laboratório, fornecimento de EPI’s, desinfecção total dos locais de trabalho, higienização constante, fechamento de parques e áreas comuns e demarcação dos locais com respeito ao distanciamento seguro de 1,5 metros entre as pessoas, além de revezamento entre as turmas e manutenção das aulas telepresenciais para aqueles pais que não se sentem seguros para retornar seus filhos às atividades presenciais. Outrossim, mantém o trabalho remoto daqueles que são enquadrados com grupo de risco.

 

Não é demais ressaltar que muitos pais necessitam do estabelecimento aberto, pois já retornaram ao trabalho e não têm onde deixar os filhos. Com certeza, a segurança das crianças é muito maior dentro de uma escola que sofrerá toda fiscalização dos órgãos competentes, do que com terceiros, sem qualquer treinamento e consciência de protocolos mínimos de segurança. Nesse contexto, é de suma importância a atuação do professor, cumprindo com seu papel na formação das crianças e adolescentes, como profissional capacitado a atuar no ensinamento dos menores sobre a gravidade da doença e da vital importância da observância, por todos, das medidas preventivas de contágio.

 

Sob este enfoque, ressalto notícia publicada em 29 próximo passado, no jornal Correio Braziliense, em que destaca carreata pedindo reabertura das escolas particulares de educação infantil no DF :

 

Uma carreata em frente ao Palácio do Buriti pede pelo retorno às aulas presenciais em escolas particulares de educação infantil no Distrito Federal. A manifestação ocorre na manhã desta quarta-feira (29/7) e reúne dezenas de carros e famílias.

 

Os pais pedem pelo direito de escolha quanto às atividades dos filhos de forma presencial ou a distância, argumentando, principalmente, que diversos familiares retornaram ao trabalho e não têm onde deixar os filhos.

 

(...)

 

“As crianças da educação infantil podem estar correndo um risco muito maior com ‘estranhos’ do que estando de volta à rotina escolar, em um ambiente totalmente voltado para elas. Nossas escolas estão preparadas para o cumprimento de todos os protocolos de segurança orientados pela Organização Mundial de Saúde (OMS)”, opina a manifestante Daniella Azevedo Oliveira, 41 anos.https://www.correiobraziliense.com.br/app /noticia/cidades/2020/07/29/interna_cidadesdf,876437/carreata-pede-reabertura-de-escolasparticulares-de-educacao-infantil.shtml

 

Embora seja legítima a preocupação do Ministério Público do Trabalho com a vida e saúde dos professores, não se pode olvidar que a normalidade já está sendo retomada, com os devidos cuidados e medidas de segurança, para que a população possa, aos poucos, ir se acostumando com o que vem sendo chamado de “novo normal”. O gradual retorno às atividades externas e presenciais tem sido uma realidade em diversos estados do país, pois é inegável que a população precisa trabalhar, inclusive para poder manter a sua subsistência.

 

Os efeitos maléficos desta pandemia se retratam não só com os milhares de infectados e vítimas fatais, mas também, com o desemprego e fechamento de inúmeras empresas que faziam a economia girar e fomentavam o emprego.

 

Quanto a segurança no retorno, reitero que o Decreto Governamental impugnado pelo Ministério Público do Trabalho estabelece diversas medidas de segurança e protocolos a serem observados (Art. 5º e anexo único, alínea “F”), bem como determina a efetiva fiscalização por parte  da Secretaria de Estado de Proteção da Ordem Urbanística do Distrito Federal – DF LEGAL, em conjunto com a atuação das fiscalizações tributária, de defesa do consumidor, da vigilância sanitária e das forças policiais do Distrito Federal (Art. 7º). Outrossim, o administrador apenas concedeu permissão para abertura, cabendo a cada estabelecimento de ensino averiguar se tem condições de cumprir com todas medidas sanitárias exigidas, estabelecendo ou não a abertura e definindo seu próprio calendário.

 

Igualmente, aos pais está sendo assegurada a continuidade do ensino remoto àqueles que ainda não se sentem seguros em encaminhar seus filhos para atividades presenciais.

 

Não cabe ao judiciário se imiscuir no mérito das decisões administrativas, fazendo-se substituir ao administrador público para impor condições de atuação ou mesmo analisar quais as melhores medidas a serem tomadas para a população.

 

Por fim, convém registrar que não há como fazer comparação entre o prazo para abertura das escolas públicas e escolas particulares, em razão da diversidade entre as duas realidades.

 

O quantitativo de alunos atendidos por escolas públicas é, a princípio, superior ao das escolas particulares. Bem assim, há maior dificuldade para a implementação das medidas preventivas e de segurança em ambiente público, em razão da necessidade de se observar orçamento e procedimentos administrativos.

 

A administração tem o dever de prestar contas, ante o princípio da indisponibilidade do interesse público. Consequentemente, sujeita-se a processo licitatório para compra de material ou procedimento administrativo para dispensa de licitação. Há todo um aspecto burocrático para que as medidas de segurança possam ser implementadas, diferentemente das escolas particulares que não se sujeitam a estas exigências administrativas e conseguem, em pouco tempo, promover a adoção de todos os protocolos de saúde exigidos para sua reabertura. Logo, a desigual realidade entre escolas públicas e escolas particulares, autoriza o tratamento distinto quanto a data de reabertura das atividades presenciais.

 

Não vislumbro, pois, qualquer ilegalidade no ato do Governador a ensejar a medida pleiteada.

 

Conclusão

 

Por todo o exposto, REVOGO a decisão liminar concedida em plantão judiciário, no que tange a suspensão para retorno das atividades de ensino presencial na rede particular de ensino do Distrito Federal.

 

INDEFIRO a tutela de urgência requerida pelo Ministério Público do Trabalho para que seja suspensa a permissão prevista no Anexo Único, letra “F”, item 2, do Decreto nº 40.939 de 02 de julho de 2020, de retorno das aulas presenciais nas escolas particulares do Distrito Federal a partir de 27.07.2020.

 

AUTORIZO a imediata reabertura das atividades presenciais na rede de ensino particular do Distrito Federal, exceto dos estabelecimentos abrangidos pela decisão judicial proferida na Ação Civil Pública 254-50-2020.5.10.0007.

 

MANTENHO NA ÍNTEGRA o Decreto nº 40.939 de 02 de julho de 2020, bem como os poderes do Exmo. Sr. Governador do Distrito Federal na gestão das medidas de enfrentamento da pandemia do novo coronavírus na área de educação.

 

MANTENHO o indeferimento da tutela de urgência quanto ao pedido de determinação para edição de novo decreto regulamentar pelo Distrito Federal, bem como de fixação de medidas adicionais para o retorno das atividades presenciais nas unidades de ensino da rede privada do Distrito Federal.

 

MANTENHO as demais decisões e determinações contidas na tutela de urgência deferida em caráter liminar em regime de plantão judiciário.

 

Em atenção aos artigos 4º e 6º da Portaria 57 de 20/03/2020 do CNJ, determino a imediata comunicação da presente decisão ao CNJ, nos autos do Pedido de Providências – PP nº 231445.2020.2.00.0000, observado o art. 4º da referida portaria, bem com a comunicação à Presidência do TRT desta decisão, para os fins estabelecidos no artigo 6º da Portaria. Observe a Secretaria.

 

Ante a urgência, dê-se ciência às das partes, inclusive dos terceiros interessados,  da presente decisão, por email e/ou celular cadastrados nos autos.

 

Sem prejuízo da ciência na forma anterior, intimem-se as partes, mediante publicação para fins processuais.

 

Intime-se o Ministério Público e o Distrito Federal por meio do convênio firmado com o PJe.

 

Vencidos os prazos já concedidos nas decisões anteriores, venham os autos conclusos para encaminhamento.

 

Dê-se ampla publicidade desta decisão.

 

BRASILIA/DF, 04 de agosto de 2020.

 

ADRIANA ZVEITER

 

Juíza do Trabalho Substituta

 

 

Live - Força maior e fato do príncipe - as rescisões contratuais durante a pandemia

Considerando o início das medidas de isolamento em meados de março de 2020, tem aumentado o número de desempregados no Brasil. Algumas empresas, ao despedir os empregados, têm utilizado como fundamento a "força maior", o que impacta nas verbas rescisórias devidas. Há quem defenda ainda que o caso poderia ser de "fato do príncipe", hipótese com consequências mais graves. Seria possível dispensar o empregado em uma dessas formas? Caso positivo, quais seriam as verbas devidas?

 

Para refletir sobre essas e outras questões, convidamos a todos para participarem de nossa live, com os Juízes do Trabalho da 10a Região, Marcos Ulhoa Dani e Ricardo Machado Lourenço Filho.

 

A live será no dia 12/08/2020, às 17h, com transmissão pelo Youtube. O chat do Youtube ficará aberto para envio de perguntas em tempo real e realização de um evento participativo e dinâmico. A participação de todos muito nos honrará.

 

Já deixamos aqui o link: https://www.youtube.com/watch?v=3OBnhtGdRio . Esperamos vocês!

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